A maioria das vítimas de homicídio no Ceará este ano era jovem, com idade entre 15 e 29 anos. Das 772 pessoas assassinadas nos dois primeiros meses de 2014, 400 (51%) têm esse perfil. O POVO fez o levantamento com base nos relatórios da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS). Os dados de Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLIs) são publicados na Internet e incluem homicídios dolosos, latrocínios (roubos seguidos de morte) e óbitos decorrentes de lesão.
Os jovens homens são os que mais morrem (foram 381 vítimas do sexo masculino e 19 do sexo feminino, nessa faixa etária). Se consideradas todas as idades, o gênero masculino chega a 93% dos CVLIs. O levantamento mostra ainda que os crimes foram cometidos majoritariamente com armas de fogo (83%). Quase metade dessas mortes aconteceu em Fortaleza, cidade que concentra cerca de um terço da população do Ceará (ver quadro).
Para o coordenador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV/UFC), sociólogo César Barreira, fatores históricos explicam o perfil da vítima de morte violenta no Ceará ser o homem jovem. Segundo ele, essas vítimas são preferenciais porque culturalmente o homem circula em ambientes mais perigosos que as mulheres. Logo, protagonizam mais disputas. De toda espécie. Das amorosas ao controle do tráfico. Esses conflitos resultam em mortes.
Barreira cobra políticas públicas de esporte, lazer, educação, cultura e capacitação profissional para essa população jovem não ser ainda mais vitimizada. E ressalta a necessidade de reduzir a circulação de armas de fogo no Estado. O Ceará tem desempenho tímido nas campanhas nacionais de desarmamento. “A gente fala muito que a violência é democrática. Mas ela termina sendo seletiva na medida em que a vítima preferencial é o homem jovem. Sendo agressor, ele se expõe mais. Então, também é mais vítima. Os jovens continuam mais vítima do que propriamente agressores. E o Estado carece muito de uma política para o jovem”, cita César.
Questões educacionais também explicam esse fenômeno da matança seletiva. “A formação dos rapazes é voltada para o enfrentamento, o ideal do macho guerreiro e a exposição dos elementos da masculinidade. As moças, até pouco tempo, tinham uma formação mais voltada para o lar. Por isso que, na violência doméstica, a grande maioria das vítimas é mulher e, nas ruas, predomina o masculino. E não existem políticas que acolham esses jovens. Essa ausência de Estado deixa um vazio. Um vazio que é preenchido com a violência”, frisa Geovani Jacó, coordenador do Laboratório de Estudos e Pesquisas sobre Conflitualidade e Violência (Covio/Uece).
Geovani critica a ineficácia do poder público na contenção do narcotráfico, outro forte vetor, conforme o estudioso, da morte violenta. “O Estado é incapaz de reprimir a expansão do narcotráfico. No fundo, os jovens estão pedindo socorro. Estão buscando formas de afirmação social. Como não encontram no Estado, encontram no mercado do narcotráfico, que lhe promete poder e visibilidade. Só que isso é algo letal e autoritário. Depõe contra qualquer lógica do Estado Moderno, instaurando regras particulares. Muito embora não se configure um estado paralelo. Porque tudo isso tem a conivência do Estado. A ramificação da lógica do crime não circula só entre a sociedade. Ela está entranhada na Polícia, na Justiça, no Legislativo... É uma questão complexa. E endêmica.”
Número
13 É a média diária de homicídios registrados no Ceará nos meses de janeiro e fevereiro de 2014
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