ana miranda 03/04/2016

A pujança de Fortaleza

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Ana Miranda S/ Email

O pessoal aqui, onde moro, com o típico humor cearense diz que o nome de nossa cidade não é Aquiraz, mas Aqui Jaz... Deveras, Aquiraz nasceu junto com Fortaleza e foi a primeira cabeça de capitania, ou capital. E hoje continua quase do mesmo tamanho. Pequenina, aconchegante, sem a maioria dos grandes problemas das metrópoles, resumida ao espaço em torno da velha praça e igreja, e em torno de uma lagoa, é um encanto. A paz de um cemitério, dizem os humoristas natos. Quase nada acontece. Acabam de instalar os primeiros dois sinais de trânsito. Mas Fortaleza, ah! Fortaleza tomou embalo e ficou imensa, espalhada, movimentada, vanguardista. Já é a quarta capital brasileira em habitantes.

Tem sua beleza, tem a feiura e sujeira das cidades grandes, tem bairros de casas, e um impressionante perfil de prédios. Uma periferia estendida como manto brilha em milhares de luzes, todas as noites. Milhares de ruas, gente em profusão. Diversidade. Prestígio. Turismo. Uma reputação internacional de paraíso tropical. Tem parques, praças, restaurantes, vida noturna, escolas, avenidas, universidades, um dos mais maravilhosos teatros do país, hotéis muito bons e variados, grandes livrarias, centros culturais, meios de comunicação, supermercados com todo produto que se deseje.

E mais, lojas de toda espécie, centros automotivos e um excesso de carros, calçadão na praia, ciclo-faixas, bicicletários, shopping centers, um grande centro de eventos, um imenso acervo de empresas e indústrias, uma vida cultural se emancipando - chegam ofertas culturais do circuito internacional mais sofisticado, ao lado de opções populares. Não apenas vêm unidades de redes comerciais, ou culturais, como saem daqui realizações muito bem-sucedidas, que são adotadas país afora. Acima de tudo, Fortaleza tem uma mentalidade em evolução. E a cidade não para de crescer, de melhorar. Comparando-a com a que vi há uns dez anos, quando cheguei, está irreconhecível.

Não vou listar aqui o que falta ou não funciona, ainda é muito. Mas impressiona a pujança da cidade. E pensar que era lugar comum dizerem que Fortaleza não tinha futuro; mal localizada, isolada, pobre, sem enseadas para portos, sem água, parecia ser areia pura e solidão. Afinal, as cidades mais antigas que cresceram, como Ur e Babilônia, eram chamadas de sociedades hídricas, sempre em torno de fontes com fartura de água.

Henri Koster, um dos mais simpáticos viajantes que aqui estiveram, e que veio em 1809, encontrou a vila com apenas cinco ruas, uns mil e duzentos moradores. Os prédios públicos - apenas três igrejas, o palácio do governador e a Casa da Câmara e cadeia - eram pequenos e baixos. As casas tinham um só pavimento, as ruas de terra nua ardiam ao sol. Uma fortaleza pousava sobre uma colina de areia, com quatro canhões, uma meia dúzia de militares, e adiante, um armazém de pólvora – era a força bélica da vila.

Isso era tudo. Sem rio, sem cais, praias de difícil acesso, diz Koster, o lugar parecia ser o mais favorável na defesa contra a invasão do estrangeiro, do pirata, contra o ataque indígena. E Koster vaticina: “Não obstante a má impressão geral, pela pobreza do solo em que esta Vila está situada, confesso ter ela boa aparência, embora escassamente possa este ser o estado real dessa terra. A dificuldade de transportes terrestres, particularmente nessa região, e a falta de um porto, as terríveis secas, afastam algumas ousadas esperanças no desenvolvimento de sua prosperidade. O comércio do Ceará é limitado e, provavelmente, não tomará grandes impulsos”. Fico imaginando o Henri Koster desembarcando aqui nos dias de hoje. Como ficaria abismado com a transformação da pequenina vila!

Fico imaginando também, às vezes, o que faz uma cidade crescer. Sobretudo, diante de instâncias tão desfavoráveis, como parecia ser o caso de Fortaleza apenas duzentos anos atrás. Uns dizem que, aqui, foi a pobreza no interior, as secas empurraram as populações no rumo da grande cidade. Mas acho que deve ter sido o trabalho do povo, o seu espírito empreendedor, sua ousadia.

Outra coisa que fico imaginando é que Aquiraz vai se juntar a Fortaleza, assim como se juntaram Crato e Juazeiro do Norte. E isso já é quase uma realidade. As construções de condomínios de luxo tomam quase toda a costa e, por dentro, na rodovia, aparecem novas empresas ou grandes lojas de venda de carro, supermercados atacadistas, shopping centers, madeireiras... Aos poucos, estou me mudando para uma cidade grande, sem sair da cidade pequena.

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