Com apenas 13 anos, Benigna Cardoso da Silva teve um fim trágico. Menina órfã de pai e mãe, estudiosa e muito ligada à religião, foi por causa de uma não correspondência no amor que sua vida foi tirada. Ao mesmo tempo, deu-se início a uma das histórias mais emocionantes de Santana do Cariri.
Na tarde do dia 24 de outubro de 1941, nove dias após o seu aniversário, Benigna foi surpreendida por Raul Alves. Ciente da sua rotina de pegar água na cacimba todas as tardes, a poucos metros da sua casa, Raul tentou seduzi-la.
A resistência à violência só fez aumentar a raiva do rapaz, que possuía a mesma idade da vítima, resultando em um ato atroz: o saque de um facão e o desferimento de cortes pelo corpo da vítima. Segundo estudos, os golpes começaram nos dedos da mão, seguindo para a testa, costas e pescoço, deixando-a quase decepada. O corpo foi encontrado no mesmo local do crime, no Sítio Oiti, da sua família adotiva.
O incidente causou comoção geral e abalou toda a população de Inhumas, distrito em que a menina morava, do município de Santana do Cariri. O corpo foi sepultado no dia seguinte e, desde então, as visitas ao túmulo da menina seguem constantes, assim como ao local do martírio. Para estudiosos como Ypsilon Félix, teólogo e membro da comissão diocesana para a beatificação da menina, "Benigna vem simbolizar o compromisso de a família viver o Evangelho e seguir a Deus pela obediência às suas leis na fé, esperança e caridade."
Raul, preso após o crime, afirmou arrepender-se do seu ato. Cinquenta anos após o ocorrido voltou ao local do crime e ainda declarou ter se convertido ao cristianismo.
Por conta da história, da personalidade e da religiosidade de Benigna, a jovem passou a ser vista como santa por todos da região, sendo também inspiração para promessas e motivos de agradecimentos pelas graças alcançadas por conta de sua intercessão.
Os eventos religiosos acontecem na região no mês de outubro, tendo início no dia de seu aniversário, 15, e seguindo até o dia da morte, 24, encerrando com uma celebração conhecida como “missa das flores”. Segundo Félix, neste dia, a Romaria de Benigna atrai cerca de 40 mil romeiros. Anualmente, cerca de 60 mil visitantes vão a Santana do Cariri. São pessoas do Brasil inteiro e de algumas partes do mundo.
Para seguir os passos
Falar do distrito de Inhumas é falar de Benigna. O povoado é vinculado ao município de Santana do Cariri, que conta com 19 mil habitantes e, apesar de ser pequeno, guarda grandes memórias da mártir. A visita ao local pelos romeiros se dá não só pela campanha para que ela se torne “santa” oficialmente, mas, como já afirmava o Padre Cristiano Coelho na época de Benigna, pelo seu título popular de "heroína da castidade".
O sítio Oiti, onde Benigna morava e foi morta, é um dos pontos mais emocionantes da região. A romaria segue para o santuário dedicado a ela, bem próximo à sua residência. Lá, alguns objetos remetem à vítima: um pote semelhante ao que ela carregava no momento da tragédia, um dos seus vestidos favoritos e esculturas que retratam o momento do assassinato. Os itens do local se confundem com os ex-votos deixados pelos romeiros, que também passam por lá para pagar promessas, rezar e retirar água da cacimba pela qual a menina passou momentos antes do seu assassinato.
No dia 26 de maio de 2012, a Igreja Matriz de Santana do Cariri recebeu os restos mortais de Benigna, mesmo local em que ela realizou os sacramentos de batismo e primeira eucaristia. O sepultamento no santuário passou a incluí-lo à lista de destinos de peregrinos e fiéis e foi um dos passos para o início do processo de beatificação da menina.
Quase santa
Primeiro passo para a canonização, a beatificação é o reconhecimento oficial da Igreja da fama e do testemunho de santidade de alguém que viveu e morreu heroicamente, marcado pelas virtudes cristãs. No caso de Benigna, o processo iniciou-se em 2011, na fase diocesana, e segue na fase romana desde 2014. "A partir daí, a Congregação para a causa dos Santos já nomeou Benigna com o primeiro título: Serva de Deus Benigna Cardoso da Silva", explica Félix. A nomeação já indica um caminho para ser chamada de beata.
Segundo estudiosos, a brutalidade da sua morte e a sua fé são fatores que favorecem o processo. Relatos históricos sobre as virtudes da jovem, artigos de livros, revistas e jornais, foram recolhidos por uma comissão liderada pelo Bispo Dom Fernando Panico e enviadas ao Vaticano. O relatório, com a biografia, os milagres e o histórico do conhecimento trágico possui 156 páginas e foi traduzido para o latim e encaminhado para o Vaticano.
Em 2016, conforme explica o teólogo, o Vaticano solicitou depoimentos de quem viveu entre as décadas de 1940 e 1980 e teve graças alcançadas e sobre a consciência popular que aconteceu com Benigna, com o objetivo de fortalecer a certeza de que o martírio da jovem é cristão. A morte como mártir facilita o processo de beatificação, já que dispensa a comprovação de um milagre.
O processo ainda está em andamento com a Congregação, na cúpula da Igreja em Roma. Não há data para divulgação do resultado. A expectativa é que seja divulgado em 2017 ou 2018. Para muitos, a beatificação é apenas uma confirmação formal daquilo em que a população já crê.
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