Trinta e nove juízes federais, dos 52 que atuam no Ceará, assinaram manifesto de apoio ao juiz Sérgio Moro e à condução que ele vem dando à Operação Lava Jato. Alvo de polêmicas, Moro agora está no centro de um debate jurídico de que teria agido fora da legalidade ao divulgar uma interceptação telefônica na qual aparece a presidente Dilma Rousseff (PT). Ela tem foro privilegiado. Para o juiz José Maximiliano Machado Cavalcanti, diretor de Assuntos Jurídicos da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), ele seguiu o princípio da publicidade, alegando o interesse público. Seguem trechos da conversa.
O POVO – O que é o manifesto dos juízes federais do Ceará?
José Maximiliano Cavalcanti – É um ato de âmbito nacional para mostrar à sociedade que a Ajufe defende a regularidade das instituições democráticas e o devido processo legal.
OP – Algumas decisões do juiz Sérgio Moro estão sendo questionadas.
José Maximiliano – O que vem ocorrendo é que algumas decisões proferidas dentro da Lava Jato vêm sendo objeto de críticas por parte de determinados setores que se veem insatisfeitos com os resultados. Trata-se de uma manifestação legítima do direito à liberdade de expressão de qualquer cidadão. O que a Ajufe e o movimento dos juízes não admitem é que essas manifestações descambem para ameaças e desqualificação do magistrado. Ele (Moro) vem conduzindo com cautela a Operação Lava Jato, tanto que 96% de suas decisões vêm sendo mantidas por instâncias superiores. Uma decisão judicial é passível de reforma, faz parte do sistema democrático.
OP – E sobre a divulgação da interceptação telefônica onde uma das pessoas escutadas é a presidente Dilma Rousseff? Isso é legal? Não era o caso do juiz Moro encaminhar ao Supremo Tribunal Federal (STF)?
José Maximiliano –Sim, é legal. No caso, o juiz Sérgio Moro vem seguindo a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que também tem respaldo no Supremo Tribunal Federal. Uma vez determinada a interceptação telefônica de um investigado e se eventualmente esse investigado se comunicar com alguma autoridade com foro com prerrogativa de função, tal fato não nulifica a colheita dessa prova. O que pode acontecer é que se essa autoridade com prerrogativa de foro, se eventualmente na conversa apresentar indícios da prática de determinado crime, o juiz deverá encaminhar o processo para a investigação específica do ato dessa autoridade. Mas são válidostodos os atos que são praticados pelo investigado que não tem foro com prerrogativa de função.
OP – Mas antes de publicizar, ele não deveria ter mandado para o STF?
José Maximiliano – Não. No caso, o juiz Sérgio Moro tem um entendimento que não é de hoje e o acompanha em toda sua trajetória na Justiça Federal. Uma vez produzida a prova e, não havendo mais necessidade de proteção da colheita da prova pelo sigilo, caberá em razão do princípio da publicidade a divulgação dos fatos. Segundo o juiz Sérgio Moro, quando entram em conflito dois princípios constitucionais – no caso, o direito à intimidade e o princípio da publicidade – considera ele que o interesse público prevalece. As pessoas têm o direito, segundo Moro, de tomar conhecimento do processo, dos atos processuais. O juiz levantou o sigilo para que as instituições e a sociedade pudessem tomar conhecimento das provas que foram coletadas pela interceptação telefônica.
OP – E o que o senhor acha do comportamento do juiz Itagiba Catta Preta? Ele teve isenção para pedir a suspensão da posse de Lula, como ministro da Casa Civil, com dezenas de manifestações dele nas redes sociais se posicionando contra o governo Dilma?
José Maximiliano – Bom, o juiz, como qualquer cidadão, tem o direito de se manifestar. Tem o direto de ter suas opções religiosas e, inclusive, político-partidárias. Inclusive o direito de se manifestar em favor daquilo que ele acredita ser o ideal social. No caso, o juiz Itagiba, de fato, circula pelas redes sociais, fotografias de postagens que ele teria feito no Facebook e que, em tese, demonstraria uma preferência político-partidária ou pelo menos uma contrariedade ao partido político que ocupa a Presidência da República. Claro que um juiz, como ser humano, pode ser sujeito a equívocos e falhar. Os caminhos processuais estão postos às partes, como no caso o expediente processual denominado incidente de suspeição ou de impedimento. A parte pode alegar que a decisão judicial está contaminada por um vício de suspeição ou parcialidade.