[an error occurred while processing this directive][an error occurred while processing this directive] Furto ao Banco Central: Bastidores de um crime sem fim | Páginas Azuis | O POVO Online
ANTÔNIO CELSO DOS SANTOS 27/07/2015

Furto ao Banco Central: Bastidores de um crime sem fim

Delegado que investigou furto ao BC conta que foi passageiro no táxi de um dos réus e que até criança o ajudou a rastrear Alemão
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Cláudio Ribeiro claudioribeiro@opovo.com.br
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Demitri Túlio demitri@opovo.com.br
FOTO TALITA ROCHA - 29/10/2009
O delegado Antônio Celso investigou o furto milionário ao Banco Central de Fortaleza por cinco anos. Após a quadrilha levar R$ 164,7 milhões, a equipe da Polícia Federal passou a rastrear a lavagem de dinheiro
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Confira especial sobre o furto ao Banco Central

Para descrever como prendeu quase toda a quadrilha do maior furto a banco do Brasil, o do Banco Central de Fortaleza, o delegado federal Antônio Celso dos Santos, agora aposentado, recorreu ao clichê policial. Diz ter montando o quebra-cabeças juntando “cada pecinha” das histórias que foi esbarrando nos cinco anos em que chefiou a investigação do caso. Na inteligência, na paciência, e em lances de coincidência, chegou a 133 dessas peças(réus). Prendeu o líder Alemão, os cavadores do túnel, recuperou muitos dos bens e identificou dezenas dos laranjas. Lembra que não foi disparado nenhum tiro. Mas, na única falha de um trabalho policial tão exitoso, admite a frustração por não ter conseguido prender dois dos participantes. “Chegamos muito perto”. Pontua que cada história do caso foi “interessante e cheia de adrenalina”.

O POVO – Dez anos depois, e se o senhor pudesse retomar essa investigação, recomeçaria por onde? O que ficou em aberto?
Antônio Celso dos Santos – Uma das coisas, que até foi uma certa frustração pra mim, pessoalmente, foi que dois dos envolvidos continuaram soltos. Não conseguimos prendê-los. Um é o Antônio Artenho da Cruz, vulgo Bode, e o Juvenal Laurindo. Apesar de algumas vezes termos quase conseguido prendê-los lá na localidade onde estavam, ali perto de Boa Viagem. O Bode, perdemos por pouco na fazenda do pai dele. E o Juvenal Laurindo também, na fazenda dos familiares, por questões de minutos. Isso foi uma frustração. Foram duas tentativas em cada um e não conseguimos.

OP – Isso foi em que época?
Celso – Para lembrar de cabeça... mais ou menos em 2008, por aí.

OP
– O quanto o senhor chegou perto dos dois?
Celso – Chegamos a fazer uma longa investigação, descobrimos onde eles estariam. Numa delas, para prender o Juvenal Laurindo, fizemos uma incursão de madrugada, quatro e pouco da manhã. Eles moram numa localidade chamada Bela Aliança, perto de Boa Viagem. Estivemos lá e descobrimos, através de depoimentos, que poucos minutos antes de a gente ter chegado, ele escutou um barulho e conseguiu fugir.

OP – Foi dele que o senhor entrou na casa e encontrou a rede ainda quente?
Celso – É, exatamente. Nós fizemos todo um aparato pra poder chegar num horário que passava um caminhão de boias frias lá. Arranjamos um caminhão do mesmo modelo, o pessoal foi todo paramentado como se fossem boias frias, ninguém foi com uniforme policial. Fomos a pé, deixamos o caminhão numa determinada distância. Ainda chegamos a ver as luzes das casas acesas e especificamente a casa onde ele estaria também estava com a luz acesa. Quando nos aproximamos, um jumento fez um barulho, acho que ele escutou, logo depois vimos quando a luzinha apagou. Corremos pra lá, a rede ainda estava quente. Ou seja, ele estava deitado do lado de fora, percebeu a aproximação e correu para o lado da serra. Você sabe como é, ali já não dá mais pra localizar, à noite, escuro.

OP
– E o Bode?
Celso – Pra ele, nós fizemos duas incursões na fazenda do pai dele. Fizemos a primeira, não deu certo. A outra, nós fomos seguindo uma pessoa desde São Paulo, que estava levando um dinheiro pra ele. Acompanhamos, quando a pessoa chegou na fazenda, que entrou pra entregar o dinheiro, nós cercamos, prendemos o camarada na hora que ele encontrava com alguns familiares do Bode. E o Bode estava à questão de 100, 200 metros, tinha ido num córrego fazer alguma coisa. Escutou o barulho, de lá sumiu. Esses dois não conseguimos prender. E são os dois que efetivamente faltaram ser presos. Estão com mandado de prisão, condenados, mas nunca foram presos.

OP – Os dois participaram diretamente do furto?
Celso – Diretamente. O Artenho ajudou a escavar e o Juvenal também.

OP – Quanto exatamente foi recuperado do furto, em espécie e nos bens leiloados? Se fala de R$ 40 milhões, R$ 65 milhões. Qual o valor mais certo?
Celso – O grande problema disso é que, se você fizer uma avaliação dos bens que conseguimos apreender e sequestrar nas mãos deles, pelo valor de mercado é um valor. Se você colocar o valor que eles pagaram por esses bens, é um valor muito superior. Eles estavam loucos pra se livrar do dinheiro. Por exemplo, um determinado bem que valesse R$ 300 mil, eles pagariam 400, 500. O Alemão (Antônio Jussivan Alves dos Santos) é um exemplo bem prático disso. Ele comprou um sitiozinho aqui perto de Brasília, pagou R$ 300 mil, gastou mais outros R$ 300 mil em equipamentos, obras e tudo mais, e quando a Justiça foi leiloar isso não achou R$ 200 mil. O Raimundo Laurindo Barbosa Neto comprou um hotel, um comerciozinho em Alto Alegre, no Maranhão, você olhava e de hotel não tinha nada. Era uma espeluncazinha. Pagou uma grana alta naquilo lá e acho que no leilão não se recuperou um terço do que ele pagou. O problema dessa avaliação é isso. Se se avaliar pelo valor de mercado e pelo que efetivamente foi obtido nos leilões, vai dar um valor muito mais baixo. Mas em dinheiro vivo, do próprio Banco Central, nós tivemos uma apreensão de aproximadamente R$ 12 milhões numa casa no Mondubim. Com o Antônio Edimar (Bezerra), o Davi Silvano (Véio Davi), foram presos lá. Depois pegamos aproximadamente R$ 5 a 6 milhões no caminhão cegonha. O José Charles (Machado Morais) estava indo pra São Paulo, pegamos ele em Belo Horizonte. Só aí está dando R$ 18 milhões. Tivemos várias apreensões de dinheiro encontrados com eles. Com o Marleudo (José Marleudo de Almeida), no Rio Grande do Norte, apreendemos de R$ 400 a R$ 500 mil. Depois, no deflagrar da operação, pegamos mais R$ 500 mil com um dos Laurindos, não lembro qual, na casa que ele tinha em Praia Grande (SP). Apreendemos mais com Neto Laurindo, R$ 100 mil numa fazenda, depois mais uns R$ 300 ou 400 mil. Se você for contando esse dinheiro picadinho, vai dar aproximadamente R$ 20 milhões em dinheiro.

OP - O Alemão tinha R$ 80 mil quando foi preso.
Celso - Tinha, na casa dele, no Riacho Fundo, que estavam escondidos debaixo do fogão. O Alemão foi um dos que a gente apreendeu menos. Mas sequestramos muitos bens dele. Dois postos de gasolina, carros, imóveis aqui em Brasília...

OP - O dinheiro deles também financiou novos crimes? Ou eles se retraíram um pouco em relação aos crimes?
Celso - Constatamos que, em parte, foi usado em outros crimes. Por exemplo, aquele túnel lá de Porto Alegre (o grupo tentaria invadir uma agência do Banrisul), um dos financiadores era o Piauí. Inclusive quando nós o prendemos lá, ele estava com uma maleta com dinheiro. Ele tinha levado para comprar equipamentos e tudo mais. E eles já tinham comprado um prédio, de onde partia o túnel. Já tinham pago a primeira parcela - se não me engano, compraram em três ou quatro parcelas de R$ 1 milhão. Então esse dinheiro foi utilizado para financiar outros crimes. Durante a investigação, constatamos que eles enviaram bastante dinheiro pra São Paulo. Pra alguns amigos e irmãos, como eles chamavam presos do PCC. Muitos deles foram extorquidos, perderam muito dinheiro assim. O problema do dinheiro do Banco Central é que foi em notas de 50 reais, usadas e não rastreáveis. Quer dizer, era um bem extremamente volátil, qualquer pessoa pode estar com uma nota de 50 e você não pode dizer que é do Banco Central. Se você não tiver a fitas de papel do amarrado, não pode dizer que é do BC. A gente precisava juntar muita prova, muita coisa que ligasse eles ao dinheiro para dizer que era dinheiro do Banco Central. Muito através de acompanhamento, de escutas, eles comprando imóveis e bens, para depois a gente conseguir provar que era dinheiro do BC.

OP
- Como a Polícia continha a possibilidade de vazamento de informações da investigação?
Celso - Eu sempre comandei uma equipe de agentes pequena.

OP - Qual o tamanho da equipe que o senhor trabalhou?
Celso - Nunca trabalhei com mais de 12 pessoas ao mesmo tempo. O problema dessa investigação é que, como ela se estendeu no tempo, eu não podia ficar com uma equipe fixa por conta disso. Então, eu tinha um ou dois agentes que trabalham comigo aqui em Brasília. O restante, eu ia conseguindo em determinados períodos, pedia ao diretor-geral, ele encaminhava aos superintendentes para que liberassem alguns agentes que eu já conhecia. Eles me mandavam, eu montava uma equipe especificamente para aquela etapa da investigação. Um exemplo prático, quando a gente estava investigando no Ceará, trabalharam junto com a minha equipe o Ximenes, que é daí, e mais uns dois ou três. Eles ficavam diretamente ligados ao meu grupo. Nessa época eu tinha uns oito agentes trabalhando comigo, mas eu centralizava tudo aqui em Brasília. A parte de interceptação telefônica, a gente fazia aqui em Brasília. Mesmo os telefones deles (quadrilha) aí no Ceará, eu captava daqui. Outras vezes eu montava o escritório em São Paulo, dependendo do interesse da investigação. Foi fácil, até certo ponto, manter esse sigilo porque como eu comandava pessoalmente uma equipe pequena, sabia tudo que estava acontecendo. Ficava muito difícil vazar alguma coisa.

OP - O total de policiais chegou a quanto?
Celso - Se eu somar todos que trabalharam em todas as fases, em cinco anos de investigação, vários agentes passaram por minhas equipes. Mas vários deles souberam só daquele pedacinho que participaram. Por exemplo, pra prender o Bode, teve gente que só trabalhou nessa tentativa de prendê-lo e não conhece nada da investigação nem de antes nem de depois. Outros trabalharam na época da prisão do Alemão e só sabem da prisão do Alemão, não sabe de mais nada. Tive poucos agentes que trabalharam comigo do início ao fim. Pra falar a verdade, do início ao fim mesmo só tive um agente, porque ele trabalhava comigo aqui em Brasília. Os demais eram esporadicamente, vinham de um Estado, de outro, passavam comigo às vezes seis meses, iam embora. Alguns até eventualmente voltavam. A questão do sigilo não foi tão difícil.

OP - Foram denunciadas 133 pessoas, condenadas 94. Se a investigação continuasse, daria mais gente?
Celso - Bem mais. O problema desses crimes que envolvem dinheiro é que fatalmente envolve laranja. O ladrão precisa ter ajuda pra poder conseguir gastar esse dinheiro. Depois começa a envolver cúmplices em outros crimes, começam a financiar outras atividades criminosas. Nós tivemos presos que estavam sequestrando os ladrões do Banco Central, sequestrando pessoas que tinham recebido o dinheiro do banco. Foi o caso daquele vigilante que repassou as informações.

OP - O Deusimar (Neves Queiroz)?
Celso - O Edilson (Edilson Santos Vieira). O Deusimar já foi outro sequestro. Ele foi sequestrado pra ser extorquido também. É um outro caso. Mas tivemos o do Edilson, vigilante do Banco Central, e do irmão dele, o Edmilson. Era sargento da PM e estava lavando o dinheiro dele (Edilson). Eles dois foram sequestrados. Depois tivemos policiais tentando extorquir quadrilhas de traficantes de drogas envolvidos.

OP - O Vitão (Vitor Ares Gonzales, policial) chegou a extorquir o Neto Laurindo?
Celso - Extorquiu. Esse (policial) já era de São Paulo. Mas tivemos aí no Ceará o pessoal que estava extorquindo. Quanto mais essa investigação fosse se prolongando, muitas pessoas iam sendo acrescentadas.

OP - Já aposentado, tendo saído da PF, mesmo após o fim da investigação, o senhor continua recebendo informações do caso?
Celso - Como eu trabalhei à frente dessa investigação por cinco anos, praticamente fiz todos os interrogatórios pessoalmente, quase todas as prisões eu estive presente comandando a equipe, muita coisa ficou guardada na minha cabeça. E tenho uma curiosidade natural de saber o que está acontecendo. Se tô aqui e fico sabendo que foi preso em São Paulo um dos participantes do furto ao BC, eu vou, pesquiso, leio, vejo o que aconteceu. Tento estar acompanhando. Já aconteceu, perto de eu aposentar, colegas recebiam alguma informação que poderia ter relação com o caso e me ligavam pra perguntar uma coisa ou outra. Por uma curiosidade pessoal, eu acompanho tudo que aparece de Banco Central. Inclusive, um mês e pouco atrás, apareceu que tinham prendido em São Paulo um participante do furto. Na realidade, ele não participou. Ele fugiu daí, do IPPOO II, junto com o Cabeção (Marcos Rogério Machado Morais), foram resgatados. O BC ainda é uma história que dá muita mídia e volta e meia aparece alguma coisa.

OP – O senhor montou um banco de dados disso tudo?
Celso – Tenho alguns rascunhos, algumas coisas que fui guardando. Por exemplo, representações que fiz no meu computador pessoal, e acabou ficando uma cópia. De vez em quando leio e acabo por relembrar. Nesta conversa que estamos tendo, vou falando e lembrando dos detalhes.

OP – E como foi o episódio do táxi que o senhor pegou em Brasília e o taxista era um dos lavadores do caso?
Celso – Isso foi uma coincidência. Aqui em Brasília, o Alemão usou algumas pessoas para lavar dinheiro dele. E um deles chama-se Jucival (Antônio Jucival Ferreira Queiroz). Até tem o nome parecido com o dele. E é daí do Ceará também. Esse camarada, o Alemão utilizou como laranja para comprar um carro, uns imóveis. Chegou a ser preso, na época da prisão do Alemão. Quando se representou pela prisão do Alemão, fez-se o mesmo com todo mundo ligado a ele. Depois, eu já aposentado, fui pegar um táxi e por coincidência quem estava dirigindo? O próprio. Ele me reconheceu de imediato. Eu também o reconheci. Mas a participação dele tinha sido de menor importância. Foi só usado como laranja. Ele confessou tudo direitinho, disse que já conhecia o Alemão de um tempo atrás. Alemão chegou em Brasília e pediu pra ele (Jucival) comprar algumas coisas. Comprou num primeiro momento sem saber, depois desconfiou, mas ele tinha certo medo do Alemão. Pensou que não iria dar problema nenhum e fez. Ficou preso acho que uns quatro, cinco meses apenas. E começou a trabalhar como taxista. Por coincidência do destino, peguei justamente o táxi dele.

OP – O senhor ficou com receio?
Celso – Não. É o tal negócio, ele estava trabalhando, me reconheceu de imediato, não quis falar nada. Eu também o reconheci, fiquei meio assim. Percebi que ficou aquele clima, perguntei “e aí, Jucival, saiu da cadeia, tá tudo bem?”. Ele respondeu “é, também reconheci o senhor, fiquei sem graça de falar”. Perguntei como estava a vida, “não, tô trabalhando aqui de taxista” e tal. Acompanhamos por uns quatro meses a participação dele e vimos que não era bandidão nem nada, foi tranquilo.

OP – Ele foi o único caso assim, de coincidência?
Celso – Que eu me recorde, já depois do caso, sim. Teve várias coincidências às vezes no decorrer da investigação. Por exemplo, a prisão do Alemão, por uma coincidência do destino, quando ele cometeu o primeiro crime aqui em Brasília, vários anos antes, eu ajudei o pessoal da DRF (Delegacia de Roubos e Furtos) aqui a fazer uma parte da investigação.

OP - O roubo a uma transportadora de valores?
Celso - Que pertence ao mesmo dono da Corpvs, o Eunício Oliveira (senador). Eles sequestraram o pessoal da Confederal, que é a empresa, pra roubar. Mas não tiveram êxito. A Polícia Civil daqui fez uma investigação muito boa e teve uma época que me pediram apoio para localizar umas pessoas ligadas ao Alemão. Inclusive aos Laurindos também. Pela coincidência, eu já conhecia o Alemão, sabia de várias particularidades dele, inclusive a tatuagem que ele tem no braço, que é o desenho de um cavalo. Quando ele foi visto aqui em Brasília, uma das coisas que chamaram atenção e serviu pra gente confirmar que era ele foi a tatuagem. Porque ele estava com a aparência totalmente diferente, cabelos longos, encaracolados, de óculos, mais gordo. Foi fácil reconhecer por causa da tatuagem.

OP - Num dos depoimentos, o Alemão disse que recebeu R$ 5 milhões e que todo mundo recebeu a mesma parte. Ele recebeu quanto?
Celso - Eles fizeram questão de dizer em todos os depoimentos, até em conversas informais, que dividiram os 164 milhões e pouco de reais em partes exatamente iguais pra todo mundo que participou. Só que eles não entregaram o dinheiro depois do furto diretamente pra cada um dos caras. Eram três grandes grupos: um do Alemão, um do Véio Davi e o outro do Fernandinho (Luis Fernando Ribeiro). Eram 12 de cada grupo, os cabeças receberam pra dividir com o pessoal deles. Somos três, 164 vai dar 50 e poucos milhões pra cada grupo. Entregaram a parte de cada grupo e ali o representante é que fazia as divisões. Obviamente eles não deram R$ 4.924.000 pra cada um. As pessoas mais próximas da cúpula sabiam que iriam receber aquilo e receberam. Mas teve o Deusimar junto com o vigilante Edilson e outro (não lembrou o nome) que eles deram R$ 5 milhões para os três. Essa diferença ia ficando com o cabeça. O Alemão ficou com mais por causa disso. O Fernandinho também. E o Fernandinho praticamente financiou quase o túnel todo. Seria normal que ficasse com uma parte maior.

OP - O senhor acha que o Alemão recebeu de R$ 20 a 30 milhões?
Celso - Não sei, fica difícil falar de valores. Porque no decorrer da investigação a gente soube que foi feita dessa forma. Quando prendemos o Edimar, ele confessou que recebeu R$ 2 milhões e pouco. O Edilson teria recebido quase R$ 2 milhões. Aí você já conta R$ 4 milhões que ficaram com o Alemão. Dos outros a gente não sabe exatamente quanto ele deu. Os mais próximos dele, como o Marleudo (cunhado), a gente sabe que receber R$ 4 milhões e pouco. Mas os outros que ele foi pagando, não. Eu calculo, por alto, chutando, que o Alemão recebeu mais de R$ 10 milhões com certeza. Não sei exatamente se foi 15, se foi 20...

OP - O Alemão esteve por onde durante a fuga?
Celso - Ele tinha uma amizade muito forte com o Edinho, que também prendemos. Ele tem um filho com a irmã do Edinho e eles são da região de Marilena, no Paraná. Quando fugiu do Banco Central, um dos lugares que o Alemão passou foi por ali. De lá ele subiu pra outros estados.

OP - Foi pro Paraguai?
Celso - Chegou a ir até o Pará. Acompanhamos alguns lugares, ele rodou muito por aí. Nessa época que ele estava perto do Edinho e se movimentou ali com parentes do Edinho. O problema dessa investigação é que muito do que a gente coletava, recebia de informações, muita coisa chegava truncada. Depois que ia pesquisando, a história às vezes era até parecida com o que tinha chegado, mas não era exatamente aquilo. Em Marilena tivemos que fazer inúmeras diligências e o Alemão já não estava lá. Tinha passado por lá. E as informações que tivemos eram de que ele estava lá. Então, são fragmentos. É que nem vocês jornalistas. Você ficou sabendo dessa história do táxi não sei nem como, mas alguém contou pra alguém, que contou pra alguém e mais alguém e chegou no seu ouvido. Às vezes o jeito que você ouviu não foi exatamente como aconteceu. Na Polícia é a mesma coisa. A gente recebe informações dizendo que tem relação direta com o Banco Central e às vezes não tem nada a ver.

OP - A investigação descobriu que os vigilantes repassaram informações à quadrilha, mas o nível de detalhamento que eles tiveram de dentro da caixa-forte foi muito grande. Eles fizeram uma movimentação milimétrica lá dentro, várias certezas. Não teve mais gente que repassou essas informações? Tinha alguém mais engenhoso pra articular isso tudo?
Celso - Eu, pessoalmente, sempre desconfiei que poderia ter alguém a mais de dentro do Banco Central ali. O problema, por outro lado, é que esse nível de detalhamento não era coisa tão difícil de ser obtida pelo próprio Edilson. A caixa-forte era como se fosse uma caixa dentro de outra caixa. E dessa caixa interna para a parede externa, onde fica a avenida Dom Manuel, dentro dela tem um corredor que circunda e os vigilantes conheciam isso, faziam esse percurso. O vigilante tinha condições de saber daquele corredor. A questão do dinheiro, quem teria passado a fita foi mesmo o Edilson. Até porque ele entrava na caixa-forte, que era um lugar que a princípio ele não poderia entrar. Mas, infelizmente, todo órgão público tem uma propensão maior ao relaxamento com questões de segurança. O cara tá ali há muito tempo, consegue ganhar a confiança. Determinadas funções que não eram pra ele fazer, por exemplo, levar contêiner de dinheiro de fora pra dentro, ele passou a fazer. Com o tempo, ele foi ganhando confiança e ouvindo histórias. O dinheiro que ia ser analisado pra ser triturado ou não...Deu pra gente perceber durante a investigação que ele teve acesso a esse tipo de informação. Inclusive, ouvimos vários dos presos e teve uma história que bateu com todos eles. De uma reunião do Alemão com o Edilson, com o Deusimar e o Véio Davi aí em Fortaleza, pra ouvir do Edilson como era o interior da caixa-forte. E o Edilson teria levado inclusive algumas fotos, que ele tirou com o celular dele de dentro da caixa-forte. Tentamos até apreender esse celular, mas não conseguimos. Acredito que seja uma versão verdadeira porque ouvimos de várias fontes, em momentos diferentes, sem que um tivesse tido contato com o outro e a história era a mesma.

OP - E quem matou o Edilson?
Celso - (risos) Esse é um grande mistério. Ele teria se suicidado. A companheira dele teria saído, quando voltou ele estava pendurado no caibro da casa dele. A casa estava trancada.

OP - O senhor acredita em qual versão?
Celso - Pra falar a verdade, policial sempre desconfia da versão oficial, principalmente se ela for muito simplista. "Ah, o cara se suicidou". Porque ele tinha sido sequestrado uma vez e pagaram o resgate. Foi sequestrado a segunda vez e aí, em tese, não teriam pago o resgate, mesmo assim ele teria sido solto. E logo depois ele aparece morto. E o irmão dele fica com o dinheiro - que ele tinha passado para o irmão sargento da PM. Eu, pessoalmente, teria aprofundado mais essa investigação, que ficou por conta da Polícia Civil. Nós só tivemos conhecimento desse suicídio depois.

OP - Qual é a sua história preferida dentro desse caso todo?
Celso - Cada fase da investigação foi interessante e todas elas foram recheadas de coisas pitorescas. Teve uma vez que eu desci no aeroporto de Fortaleza, peguei um táxi e o taxista me contando ótimas histórias relacionadas ao Banco Central. E soltava uma piada. O nordestino, principalmente o cearense, tem a veia cômica muito aflorada. O taxista dizia "esses caras do Banco Central tinham que ser contratados pelo governo pra fazer o nosso metrô. Vieram aqui, cavaram um túnel, em 90 dias resolveram o problema. O metrô tá parado aqui não sei quanto tempo e ninguém faz nada". Outros me contavam histórias, não sabiam que eu era o delegado do caso, "fulano e sicrano estão envolvidos nessa história por causa disso e disso". Ouvia muitas histórias. Nessas investigações de campo, eu ia muito pra rua de forma velada. Aqueles bares em frente de onde saiu o túnel, tinha uma senhora lá, eu fui para o bar como se fosse um freguês comum tentando levantar alguma coisa. Se os caras almoçavam ali, a gente tinha tido a notícia de que eles compravam marmita lá. Bate papo daqui, dali, ela me deu uma pista que foi essencial pra eu identificar aquele Paulo Sérgio. Que botou a empresa de grama sintética no nome dele, fez a identidade com a touca (o único que mostrou o rosto publicamente na rua onde o túnel foi cavado). Esse era um grande mistério pra gente. Ela chegou a contar que num determinado momento que ele esteve lá, com uma camiseta daquelas sem manga, ela viu uma tatuagem nas costas dele, na omoplata, de uma palmeira com o sol. Muito tempo depois, quando nós identificamos o Paulo Sérgio, uma das primeiras coisas que fiz questão de ver foi essa tatuagem. E estava lá, certinha, a palmeira com o sol. Esses detalhes é que fazem a investigação ficar, não vou dizer mais divertida, mais excitante. , o único que mostrou o rosto publicamente na rua onde o túnel foi cavado. , o único que mostrou o rosto publicamente na rua onde o túnel foi cavado. Você vai pegando esses pequenos detalhezinhos, essas pecinhas do quebra-cabeça, e vai montando.

OP - O Paulo Sérgio era o Jorge Luiz?
Celso - Era o Jorge Luiz (da Silva), conhecido também como Mineiro. Olha que interessante: nós só descobrimos o Jorge Luiz confirmando essa história da tatuagem, mas nós chegamos a ele por vias totalmente transversas. Ouvíamos uma história que o Mineiro teria participado ou ajudado alguns dos caras do Banco Central num assalto em Belo Horizonte e esse assalto teria dado zebra. Porque quando eles estavam dentro do banco, um policial que passava do lado de fora desconfiou. E eles tiveram que sair do banco trocando tiros com a PM. O Marcos Rogério parece que levou um tiro de raspão perto das nádegas, o Alemão também teria levado um tiro de raspão, e quem teria ajudado eles nessa fita (no jargão policial, a dica do assalto) teria sido o tal do Mineiro. Eles tinham inclusive sequestrado o gerente do banco, estavam com a família do funcionário sequestrada quando tiveram esse problema. Vamos tentar descobrir qual foi o assalto com essa característica, mais ou menos naquela época. Depois de muita pesquisa, descobrimos que teve essa tentativa de assalto e que um dos envolvidos, que teria fornecido um carro, seria o Jorge Luiz. Esse carro estava no nome da mulher dele. Pesquisando a mulher e esse assalto foi que conseguimos a identificação e a foto. Quando vimos a foto, "é o cara". Levamos inclusive pra dona do bar em Fortaleza para fazer um reconhecimento. Ela viu muito ele, batia muito papo com ele. Ele é até meio parecido com o Pedrão (Pedro José da Cruz). Ela disse "é esse mesmo". A gente vai juntando esses detalhes na memória, outros nos rascunhos. Qualquer papel que estivesse na frente eu anotava um detalhe e ia guardando.

OP - E quando o senhor vai escrever o livro?
Celso - Eu comecei, pra te falar a verdade. Aí dei uma parada. Eu estava muito na dúvida de como seria contada essa história, na primeira ou na terceira pessoa, se uma coisa mais técnica ou mais romanceada, de leitura mais fácil pra qualquer pessoa. Comecei a juntar da minha memória casos pitorescos, engraçados. Casos até de honestidade entre os bandidos.

OP - Tipo o quê?
Celso - Tipo o cara foge e faz questão de levar o dinheiro dele certinho. Ou ele morre e o pessoal faz questão de pagar pra família o dinheiro dele.

OP - Teve isso?
Celso - Teve. Nessas quadrilhas tem muito isso. Eles fazem questão de demonstrar que são muito corretos. Por exemplo, a história da divisão do dinheiro. Quando terminou o furto, cada um não pegou sua parte, não. Alguém guardou. Naquela casa do Mondubim foram levados pra lá mais de R$ 50 milhões. O Antônio Edimar, o Véio Davi e um outro ficaram guardando o dinheiro. O cara tinha que confiar nesses caras. Eles iam lá, pegavam uma parte, anotavam. Quando apreendemos esse dinheiro, achamos uma tabela bem interessante, de quem já tinha tirado quanto de lá.

OP - Tem uma conversa do Véio Davi com o Fê (Fernando Carvalho Pereira) pedindo pra receber uma parte dele do dinheiro. Falando em dividir o valor em prestações, em financiar carros. E o Véio Davi pedindo paciência que ele vai ajeitar.
Celso - O Véio Davi era um dos caras que eles consideravam mais ali. Eles confiavam, era meio um tiozão pra eles. Consideravam como um cara mais correto. Teve um dos grampos que lembro bem, parece que alguém ligou de São Paulo pra ele e disse "olha quem tá aqui?". Fizeram uma reuniãozinha pra conversar com o Véio Davi. Tava o Fê, o Tiganá...

OP - O Magrelo?
Celso - Um dos apelidos do Jeovan Laurindo era Boca de Lata e Magrelo. Poderia ser ele também. Sei que era uma reunião de três ou quatro conversando com o Véio Davi. E ele aconselhando, "olhe, cuidado que os caras estão de olho em vocês". Dando conselho de tiozão. Pegamos vários áudios. Você imagine, em cinco anos fazendo acompanhamento dos caras e ouvindo as conversas deles ou de pessoas ligadas a eles, o tanto de histórias que nós ouvimos. Por isso que digo que, às vezes, tocando num detalhe, me faz lembrar de outro.

OP - Quantas horas vocês passavam ouvindo o pessoal da quadrilha?
Celso - Ah, muito tempo. Era humanamente impossível que eu ouvisse tudo pessoalmente, isso é óbvio. A gente levantava alguns suspeitos. Representava ao juiz pela interceptação telefônica. Obviamente a gente tinha que justificar por que estava pedindo, que já era um levantamento prévio do que tínhamos feito. Demonstradas as necessidades, a gente começava a ouvir o pessoal. Eu gostava de acompanhar isso muito de perto, até pra poder ir montando o quebra-cabeça. Porque às vezes uma frase que o cara fala no meio da conversa é a aquilo que está faltando pra montar uma história. Durante cinco anos, eu acredito que foram milhares de horas de coisa que a gente ouviu e também teve milhares de coisas que não interessavam. O bandido não conversa só o que te interessa pra investigação. Acabou que descobrimos muita traição (risos), muita safadeza, muita coisa que não tinha nada a ver com a investigação.

OP - E, de tantas histórias, qual a que o senhor acabou guardando pro senhor, que lembre de nem ter contado ainda?
Celso - Tem coisas que marcaram a gente, que ouvíamos nas conversas ou que até presenciou, mas como não tinha nenhuma relevância criminal, eram coisas pessoais dele, não foram para os autos. Teve inclusive bandidos que, numa conversa informal, acabaram repassando dados, "putz, entreguei uma coisa de fulano". Uma das coisas que nos ajudaram foi essa proximidade com a investigação. Você prende o cara, ouve ele formalmente, insiste, insiste, e nada. Aí você faz uma viagem com ele, pra uma diligência, no meio do caminho, batendo um papo, ele solta a história que te faltava. Quando ele percebe que falou, tenta disfarçar. Quando prendemos o Edinho (Edson Vieira de Almeida), a gente queria chegar no Alemão. Um dos laranjas do Edinho no Mato Grosso acabou contando pra gente do Alemão, que ele esteve lá com o Edinho. Descobrimos que ele conhecia o Alemão. A gente vinha com ele num carro e o Edinho no outro. Ele veio falando algumas coisas pra gente. O Edinho, num determinado momento, percebeu que ele estava falando muito. Paramos os carros num restaurante de beira de estrada já à noite, deixei um agente com o Edinho e outro com esse camarada. Quando voltamos, o agente disse "doutor, o Edinho fez um sinal de cortar o pescoço do outro, como se ele estivesse conversando demais". Porque o cara estava levando a gente num tal Sítio do Ferreiro, onde o Alemão teria estado com o nome de Paiva. Porque o Edinho não entregou e esse cara tinha ido lá uma vez com o Edinho visitar o Alemão. Quando o Edinho percebeu que a gente tomou aquela direção, sabia que o cara estava contando. Na parada do restaurante, ele estava ameaçando o cara fazendo sinais. Então era verdade. E demos uma prensa no Edinho, de ele querer ameaçar o outro. "Não tô ameaçando, não". Quando chegamos lá, o cara sabia do sítio do Paiva, mas não sabia exatamente onde era um sitiozinho que o Edinho tinha comprado, que não falou pra gente e não queria falar. Mas o filho desse rapaz tinha ido uma vez lá. O cara entregou o Alemão, mas não queria entregar diretamente o Edinho. Só que o filho dele, um garoto de uns nove anos, estava ouvindo a conversa. Quando perguntei para o pai dele, "o senhor nunca foi lá? não sabe ir lá?", o menino fez aquela cara de "ué, como não?". Percebi e pedi pros agentes ficarem ouvindo o cara enquanto fui conversar com o menino. "E aí, você já foi no sítio?", e ele "já". "Aposto que você é sabido e sabe chegar lá. Leva a gente?". "Levo, mostro". E quando o pai dele percebeu, quis ainda interferir, não deixamos e foi o guri que levou a gente lá. Esses detalhes é que deram adrenalina.

OP - O que essa investigação mudou na sua vida pessoal?
Celso - Talvez pela repercussão que o caso teve e também pelos resultados. Acho que a forma como conseguimos fazer essa investigação, ela obteve pleno êxito. Porque conseguimos identificar todo mundo que participou, conseguimos recuperar uma grande parte do dinheiro. Não houve em momento nenhum do processo questionamentos da lisura do comportamento da Polícia. Fizemos a coisa da forma mais técnica possível. Os próprios bandidos, até em interceptação telefônica, eles elogiavam o trabalho nosso, "pô, os caras são diferenciados".

OP - Precisaram dar tiro em algum momento?
Celso - Troca de tiros? Deixa eu ver... que eu me recorde, não. Todas as prisões que fizemos, muitos deles são cabeças do PCC. Em nenhuma ocasião a gente precisou ir para o enfrentamento. Porque a gente fazia um levantamento prévio. Nem na invasão de Porto Alegre, que tinha 24 deles lá dentro do prédio, a gente não precisou dar tiro. Levamos o Grupo Tático, tudo pra segurança, mas eles foram já sabendo em que andar cada um estava, que armas poderiam ser encontradas, tudo direitinho. Os caras foram filmados quase três meses. Isso nos facilitou muito. E também o apoio da direção geral da PF. A Justiça Federal foi muito ágil, doutor Danilo foi uma surpresa, nós não o conhecíamos, passei a admirá-lo, inclusive. Ele acompanhou muito de perto o caso. A doutora Rita, que é a procuradora, excelente. Foi uma investigação que, pra mim, foi fácil fazer, até por conta disso.

OP - E qual foi o momento mais difícil da investigação?
Celso - Pra falar a verdade, foi a decepção de não termos conseguido prender o Antônio Artenho e o Juvenal. Porque preparamos toda uma operação, três meses. Tínhamos certeza absoluta que a gente conseguiria prendê-los. Com o Artenho, teve um caso muito pitoresco. Eu estava fazendo um levantamento lá perto de Bela Aliança com um agente que trabalhava comigo, o Nicodemos. De madrugada, talvez duas da manhã. Voltando de Boa Viagem, decidimos cortar e passar na pista que passa pela fazenda do pai do Bode, só por desencargo de consciência, pra ver onde saía. Era época de chuva, encontramos um motoqueiro caído no meio da estrada tentando levantar a moto. Estava bêbado de não conseguir ficar em pé. Quando a gente levantou o cara, olhou pra ele, perguntamos onde morava, o cara era irmão do Antônio Artenho. Era a oportunidade que a gente tinha de chegar lá no sítio. Vamos socorrer, levar, a oportunidade de a gente ver como é. A gente via o sítio da estrada, não conseguia entrar pra ver como era a casa. Levamos ele em casa. O agente foi pilotando a moto e eu levei ele no carro. Na casa, que sorte, mas o cara ficou meio receoso se abria. Ficaram um tempo sem acender as luzes de dentro da casa. Esqueci o nome dele, "estamos aqui com o fulano", ele chamou o pai. Tivemos a impressão, tanto eu como o agente, de ter visto uma pessoa que pôs só a cara para o lado de fora e voltou pra dentro. Como a gente não tinha certeza que era o Bode, decidiu não abordar. Tinha quatro, cinco homens, e só nós dois, sem certeza que era o cara. Vai que alguém reage e pode dar um problema maior. Foi assim que tivemos oportunidade de fazer o levantamento de como chegar na casa, o que tinha próximo. Na história do cara que acompanhamos desde São Paulo, que foi entregar o dinheiro lá, já tínhamos o mapinha da casa por conta disso. Uma das decepções foi essa, porque eu pretendia fechar com os 36 (que executaram o túnel e o furto) presos. Fora os mortos, obviamente, o Fernandinho, que foi sequestrado e morto, e o Cebola (Anselmo Oliveira Guimarães), achado morto dentro de um poço. Amarraram ele, sequestraram, e a gente desconfia que possam ter sido policiais corruptos do local. Ele passou um tempo sequestrado na mão desse pessoal, apareceu dentro de um poço num sítio abandonado. Em São Paulo, acho que em Arujá.

OP - Esse crime do Banco Central é um caso sem fim?
Celso - Esse dinheiro que não conseguimos recuperar, infelizmente, ele tá servindo ou serviu pra financiar vários outros crimes. Quase todos eles mexiam com tráfico de drogas, a maioria era dona de biqueiras de tráfico. Deve ter financiado compra de drogas, outros crimes. Era por isso que tínhamos interesse em recuperar a maior parte possível do dinheiro. Nosso interesse não era só simplesmente prender quem furtou. Com três meses, já tínhamos praticamente todo mundo identificado. Se a gente partisse pro normal da investigação, identificar e pedir a prisão, ia ficar um monte de gente solta. Eventualmente iam ser presos, responder por um furto simples, em que a pena ia chegar no máximo a cinco, seis anos. Iam ficar com todo o dinheiro, que iria financiar inúmeros crimes. Não íamos conhecer muito do que passamos a conhecer, dessas ligações entre eles. O próprio diretor geral da PF, quando expusemos a investigação, foi muito receptivo a isso. Não adiantava simplesmente prender. Dissemos: "eles não cometeram o maior furto da história do Brasil? Nós vamos dar a maior resposta possível a isso". A própria Justiça tem condenado esses caras a 40 anos, 30 anos, coisa que eles nunca sonharam.

OP - Tem dois condenados que a pena é de 160 e 170 anos.
Celso - Isso só foi possível porque o juiz teve em mãos dados que o possibilitaram a condenar esse pessoal não só pelo furto, mas por lavagem de dinheiro, comprovada. As formações de quadrilha, o planejamento de outros crimes, tudo isso foi sendo somado à pena deles. Se ficássemos naquela investigação simplista do furto, não tinha dado, esse crime teria compensado muito. Pergunta pra esses caras que estão presos se o furto ao Banco Central compensou? Eles têm uma vida criminosa extensa e nunca ficaram tanto tempo presos como agora.

OP - E a história sem fim também em relação ao imaginário popular. Tem toda uma aura de fantasia em cima do caso.
Celso - Tem, tem, e principalmente no Ceará, se tornou uma história com mais de mil versões. Algumas para o freguês (risos). Mas a versão oficial, que é a que está nos autos, nela os bandidos não se deram bem de jeito nenhum. Tem áudios deles reclamando, "nunca levei uma cana dessas", "esse dinheiro é maldito". É óbvio que muitos deles continuam com dinheiro, perderam parte em extorsões, pagaram advogado, sobrou alguma coisa. Mas os que estão presos, pelas condenações, acho que se fosse dada a eles a possibilidade de voltar no tempo, talvez eles não tivessem feito. O Alemão, por exemplo, nunca pegou uma cana dessas. Só conseguem ir pra rua se forem resgatados de presídio, que nem o Marcos Rogério e outros. As penas são muito altas.

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