Onde está a minha identidade?
ISRAEL VIANA DE ALBUQUERQUE
Minha mãe chegou do trabalho por volta das seis horas da noite, já cansada da rotina exaustiva, e para deixar o clima ainda mais desagradável, ela havia perdido seu documento de identificação. Apesar do esforço que tivemos, entre procuras e bagunças, permanecemos diante do mistério de seu paradeiro. Esse cenário de escarafunchar a casa foi muito importante, pois serviu de combustível para uma reflexão sobre a nossa própria essência, a nossa própria realidade enquanto povo e nação.
As notícias sobre o Brasil, seja na televisão ou nos meios impressos, são as mais indecentes e desagradáveis que um país poderia receber. Nosso país, um dia chamado de Terra de Santa Cruz, hoje, lastimavelmente, não é encarado pelos seus feitos ou pelas belezas que poder-se-iam cultivar, uma vez que as estatísticas fazem alusão ao quadro de violência existente, aos baixos índices educacionais, à falta de acessibilidade, ao desmatamento desmedido, à corrupção generalizada, à fragilidade das instituições e, o mais implausível, a falta de patriotismo.
As escolas, que deveriam incentivar o amor à pátria, mal conseguem cumprir a função de aprová-los em testes por elas mesmas criados. Os alunos, aqueles que deveriam carregar parte da bagagem organizada por seus antecessores, estão acorrentados pelas obrigações curriculares fúteis e laceradoras de talentos.
Ensinam-lhes os cálculos matemáticos, e, quase todos, não conseguem administrar as suas próprias obrigações financeiras; ensinam-lhes as características geográficas de nosso país, e são incapazes de valorizá-las e congregá-las em sua base espiritual; ensinam-lhes a história de nosso povo, aliás, desconstroem. Sabem sobre as Guerras Mundiais, sobre a Independência ou sobre qualquer quimera, no entanto, não conseguem amar o próprio solo em que pisam, cospem e maltratam!
E é ainda mais triste e decadente quanto: o apreço ao que não é nosso. O povo brasileiro, tão rico em sua concepção, repleto de talentos nos mais diferentes logradouros, tendo representantes para quase tudo que toca a alta cultura, perfídicamente, exalta a música, as artes, a literatura e a ciência estrangeira.
Temos uma lista de antepassados que construíram um acervo cultural de relevo! Entretanto, quantos hoje seriam capazes de reconhecer, mesmo que minimamente, Villa-Lobos, Carlos Gomes, José Bonifácio, Mário Ferreira dos Santos, Manoel de Barros, Josué Montello?
Se essa pergunta já lhe causou algum desconforto, veja essa: Quantos hoje conseguem produzir - com tamanha qualidade - o que aqueles um dia fizeram?
A nossa cultura não fenecerá, posto que ainda existem mentes, mãos e peitos resistentes. Por outro lado, o povo já perdeu o olhar sobre o que ele sente ser Brasil. Vivemos errantes e vazios da “Pátria Mãe Gentil”, não temos o sentimento acolhedor, nem a paz que nos sucumbe de qualquer olhar traiçoeiro. Essa emoção envolvente, que faz amarmos a Bandeira Nacional, que impulsiona-nos a crer que mesmo perante qualquer dificuldade estaremos unidos pelo ideal de Brasil, isto, caríssimos leitores, está recôndito ou morto nos corações de nossa geração.
A população sobrevive com o desentender. É como se vivêssemos em um local sem nome, não há significado...
Isso é um verdadeiro martírio.
A inflexão desse clímax está nos raríssimos momentos em que conseguimos resgatar o fluido que estufa o nosso âmago, talvez o único, ao meu juízo, tão eficaz: os desfiles militares.
Os tambores, o ritmo, a marcha ordenada, a feição firme, o respeito à bandeira do Brasil, o esforço desses homens, sem dúvida, é a prova de brasilidade e amor à pátria.
Eles bradam ao povo: “Nós somos da Pátria a guarda, fiéis soldados, por ela amados, nas cores de nossa farda, rebrilha a glória, fulge a vitória! Em nosso valor se encerra toda a esperança que um povo alcança! Quando altiva for a Terra, rebrilha a glória, fulge a vitória...”
E vocês, o que são? Soldados? Não. Vocês são as águas do amazonas, o cântico mavioso dos rouxinóis, dos uirapurus, são os ventos do nordeste, são as chuvas estridentes do sudeste, são nossas riquezas minerais, você é Brasil.
Olhe para o céu e sinta a paz em seu coração, reflita sobre sua existência, faça uma verdadeira exegese do que você representa para si e para o mundo. Encontre o ponto de equilíbrio, de sanidade, e não permitas que tenhas o mesmo destino do apaixonado Werther, em “Os Sofrimentos do Jovem Werther”, de Johan Wolfgang Von Goethe.
Livre-se desse abismo! Nós somos tudo aquilo em que a nossa vista consegue abarcar!
Eu lhes pergunto onde está a nossa identidade? A de minha honrada mãe estava em um bolso perdido de roupa, e a sua? Olhe ao redor, você encontrará! Agarre-a para nunca mais perdê-la, mantenha-na jorrante para que dela outros possam beber e, desse modo, logo sentirá o que é ser brasileiro...
ALUNO DO COLÉGIO FARIAS BRITO, MEDALHISTA PELA OLIMPÍADA NACIONAL EM HISTÓRIA DO BRASIL E CERTIFICADO PELO CURSO DE DIREITOS HUMANOS PELA FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA.
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