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Menino crescido na Gentilândia das décadas de 1950 e 1960, Airton Monte foi, antes de se formar psiquiatra e escritor, talentoso jogador de futebol, herança do pai profissional, e coroinha zeloso - o que chegou a nutrir na mãe a esperança do filho seguir carreira eclesiástica.
Da primeira vocação, restou a paixão pelo esporte, particularmente pelo Tricolor do Pici. Um misticismo profundamente humano permaneceu da segunda, que o fazia se referir a São Francisco de Assis como “meu Chiquinho”. Ateu desde os tempos da juventude, quando ingressou na Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará e no movimento comunista, Airton chegou a contar em entrevista sobre a dor de abandonar a fé cristã.
Encontrou em São Francisco de Assis o homem perfeito para mediar a relação com o “homem lá de cima”. “Ele achava que São Francisco era o maior cristão que havia existido, o exemplo mesmo do comunista”, contou sua filha Bárbara, 35.
Em casos mais graves, a exemplo de uma cirurgia dentária (tinha fobia de dentista), recorria a intercessão de Sônia, sua esposa. Nas últimas semanas, inclusive, quando o câncer no fígado diagnosticado em novembro de 2009 recrudesceu, orava diariamente, como ele mesmo confessou à filha. “Ele era um ateu fajuto”, constatou Bárbara. No domingo, por sinal, o amigo e livreiro Sérgio Braga foi à missa em Canindé em intenção do companheiro de boemia. Semana passada já havia trazido de lá dois escapulários para ele.
A devoção pelo santo representava a opção feita por uma vida demasiadamente humana de Airton, engajada nas lutas políticas do País, inspirada pelas mesas de bar de Fortaleza, envolvida no trabalho psiquiátrico com doentes mentais no Hospital Mira y Lopes. Deixou amigos ao montes, como o escritor Carlos Augusto Viana e o artista plástico Audifax Rios.
Airton Monte - que estreou na literatura com os contos de O Grande Pânico (1979), mas se notabilizou pela crônica, gênero cotidiano, corriqueiro, que exerceu diariamente neste mesmo jornal desde a década de 1990 - foi antes de tudo um profano.
Talvez por isso mesmo tenha recebido apenas oito votos - contra 26 do advogado Ernando Uchôa Lima - para a cadeira de número 14 da Academia Cearense de Letras, vaga com a morte de Barros Pinho. A eleição, realizada coincidentemente ontem, garantiu ironicamente uma homenagem às avessas. “Eu já dei os pêsames à família, estou dando à literatura cearense e também à Academia”, declarou sobre o fato Pedro Henrique Saraiva Leão, presidente da ACL.
Devido a complicações do quadro clínico, Airton não se alimentava mais, estava prostrado numa cama e há dois dias praticamente inconsciente. “O quadro foi de uma malignidade impressionante, mas teve um aspecto muito bom, que ficou exatamente de acordo com a bondade de Airton Monte. É que ele não sofreu”, garantiu o acadêmico, amigo e médico José Telles.
Airton morreu aos 63 anos, em casa, às 20 horas. Deixa a esposa Sônia e os filhos Bárbara e Pablo.
Perfil
Natural de Fortaleza, onde nasceu em 1949, Airton Monte era médico psiquiatra formado pela Universidade Federal do Ceará em 1976. Escritor e jornalista, escrevia crônicas diárias para o caderno Vida & Arte, do O POVO; e participou de várias antologias de poetas e cronistas cearenses. Publicou seis livros. Entre eles, Memória de Botequim e Moça com Flor a Boca, que foi indicado para o vestibular da UFC.
Repercussão
Acho que ele não morreu de jeito nenhum. O problema nesse momento é a saudade, a gente vai sempre ficar com um gosto de saudade. Esse é o dano.
Demitri Túlio, jornalista e amigo
Airton escreveu com a alma na ponta dos dedos. E porque fez do afeto arma poderosa contra o esquecimento do que é demasiado humano, não será esquecido.
Fátima Mesquita, secretária de cultura do Município
Airton Monte era um cara muito alegre, muito criativo e gostava muito do improviso. Sempre com um conhecimento da língua bem apurado. Mas enquanto figura humana ele também vai deixar muita saudade.
Miguel Macêdo, jornalista e professor, ex-editor do caderno Vida & Arte
Airton Monte era um dos grandes cronistas do Ceará. Nós tivemos o Caio Cid, depois o Milton Dias e ele foi o terceiro e último grande cronista do estado do Ceará. Eu já dei os pêsames à família, estou dando à literatura cearense
Pedro Henrique Saraiva Leão, médico e presidente da Academia Cearense de Letras
Vai ser uma lacuna. A gente só tem mesmo a lamentar. E ele se foi tão novo, teria muito ainda a compartilhar
Vânia Dummar, jornalista e integrante do conselho editorial do O POVO
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