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A história é contada por um delegado já com certo tempo de polícia, que pede o segredo de seu nome. Diz que, certa feita, pelos anos 1980, Mainha saiu com um serviço a cumprir. Mataria um fazendeiro, inimigo de outro também dono de terras. Chegou lá, teria fraquejado. O que morreria era um amigo seu. A conversa acabou virando uma oferta, agora da “vítima”. Então Idelfonso Maia Cunha, temido e respeitado, do alto de toda “honra” que se atribuía a um pistoleiro, topou. Dias depois, pelo dobro, matou o mandante.
Talvez esse também tenha sido mais um folclore no lastro de Mainha. Em aluguel de morte, só sabe o valor quem paga e quem recebe. Assim foram as várias histórias sobre ele. Ontem, o homem que caiu com uma bala na testa e outras espalhadas era tido como o “último dos pistoleiros”. Lenda entre os que cobravam para “fazer alguém”, morreu de olhos abertos, cabeça perfurada, num terreno baldio perto do sítio onde morava.
Foi-se o corpo baleado, fica o mito, derrubado num matagal cheio de lixo. Mainha morreu mitificado em seus segredos. É regra de quem cobra para matar ficar em silêncio. Feito ele, vários. Joaquim Leandro, o Catanã, de fama e manchetes nos anos 1950 e 1960, cumpriu pena na cadeia pública, hoje Centro de Turismo, ao lado da Santa Casa. Antônio Feitor, acusado de matar o prefeito de Aiuaba, em 1969; depois o filho, Pantico, seguindo a sina familiar, condenado por matar outro prefeito, de Acaraú, João Jaime Ferreira Gomes, em 1998.
Courinha, outro lendário do meio, disputava a fama de “maior pistoleiro do Nordeste” com Mainha. Contagem palmo a palmo, morte a morte, ou em aferições nunca confirmadas. Quem confirmaria? Às vezes, nem as famílias dos mortos. Irmãos Sebastião e Isídio Ferreira, caçados e presos pelo COE, a elite truculenta da PM cearense dos anos 70 e 80, foram igualmente assustadores e heroificados após seus tiros de encomenda. Todos esses senhores sabedores que o segredo é a grande arma desse negócio de matar e receber pelo feito.
De lá pra cá, a pistolagem mudou o perfil. Banalizou-se. Mata-se em rixas por drogas – geralmente jovens abaixo dos 25 anos, que matam ou morrem. Ou alguém endividado topa a parada. Pistoleiros já não são poucos nem afamados. E cavalo, feito antigamente, só na força do motor da moto ou do carro que usam.
Mainha foi vivendo nos seus “esconderijos”, sempre silenciosamente. Hora dessas, acabava preso, por armas que portava ou confusões em que se envolvesse. Como quando foi preso no distrito de Campos Belos, entre Maranguape e Caridade, em 2002, num batizado familiar. Cercado, trocou tiros com a polícia. Muitos tiros. Era procurado por uma condenação de 28 anos em São Miguel (RN). À época, respondia a outros 58 anos de cadeia no Ceará, em regime semi-aberto. Tiros e anos de cadeia em dezenas.
Diziam que Mainha tinha padrinhos fortes. Além do bom comportamento, seria o que lhe ajudava nas progressões de penas. Há dois meses, saíra do regime semi-aberto para o aberto. Cumpria seus dias na Penitenciária Agrícola do Amanari, em Maranguape, perto de onde morava e morreu. No regime aberto, precisava ir ao fórum só uma vez por mês.
Em entrevista ao O POVO, admitiu não gostar do ex-deputado federal Moroni Torgan, hoje em trabalho missionário de sua igreja dos Santos dos Últimos Dias em Portugal. Foi Moroni, então delegado, que o prendeu e armou holofotes para a clássica cena das algemas num mito. “Ele fez toda a campanha (política) em cima do meu nome”, queixou-se pelo jornal.
Para o sustento, Mainha tinha sítio, topics e usufruía da fama para algum pedido ou proteção. Assim dizem. Ninguém confirma, ninguém nega. Sempre rebateu o tal “rosário de crimes”, jargão da época. Só matou inimigos, assumia. Quixadá seria até região mais segura para circular do que a jaguaribana. Nos presídios, era considerado. Abrigou repórteres do tiroteio no dia em que dom Aloísio Lorscheider virou refém no IPPS, em 1994. Lá, morava na Vila Rica, área nobre do presídio. Solto, morreu com bala na testa, outras pelo corpo, garantia de quem fez o serviço. Morreu de morte matada, como se fez na vida.
CRONOLOGIA
OUTUBRO DE 1955
No dia 28 de outubro, nasce Idelfonso Maia da Cunha, em Alto Santo, na região jaguaribana. Estudou no colégio Salesiano de Limoeiro do Norte.AGOSTO DE 1988
Após 11 anos de fugas, Mainha é preso em Quiteranópolis, na Região dos Inhamuns. Admitiu ter executado “apenas” sete pessoas, entre elas o então prefeito de Iracema, Expedito Leite, chacinado em 1977, na Capital.AGOSTO DE 1996
Mainha sofre atentado no Instituto Penal Paulo Sarasate. Segundo ele, havia complô para matá-lo. Já condenado a 30 anos de prisão, o pistoleiro pegou 12 anos pela morte de Orismildo Rodrigues da Silva, em Quixadá, e 18 pelo assassinato do despachante Iran Nunes.
ABRIL DE 1997
Mainha é condenado a 64 anos de prisão pela chacina de Alto Santo, ocorrida em 16 de abril de 1983. A chacina ocorreu no quilômetro 248 da BR-116, próximo ao posto de combustível Universal. Na ocasião, foram mortos o ex-prefeito de Pereiro, João Terceiro de Sousa, a mulher dele, Raimunda Nilda Campos,o motorista Francisco de Assis Aquino e o policial militar Joâo Leonor de Araújo.
MAIO DE 1999
Em novo julgamento (o primeiro foi anulado), Mainha é absolvido por falta de provas.NOVEMBRO DE 2001
Depois de um ano e dois meses em regime semiaberto, Mainha volta à prisão.
NOVEMBRO DE 2002
ONTEM
Mainha é assassinado a tiros, em Maranguape. Ele cumpria sentença em regime semiaberto há pelo menos três anos.
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