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Tambor se transforma em instrumento musical quando a vista se amplia em possibilidades. As latinhas ajudam a compor as batidas acompanhadas do corpo num movimento de pernas, mãos e braços. Foi com criatividade que dois jovens perceberam que poderiam romper a rotina silenciosa de uma das ruas do Conjunto Palmeiras com acordes inventados. Era o jeito de convidar os meninos que corriam sem rumo a se encontrar na música do projeto Palmerê. O grupo reúne, há cinco anos, crianças e adolescentes na vontade de forjar novas narrativas e esmaecer as fronteiras da periferia.
As primeiras músicas ressoaram na rua Maguari pelas mãos dos jovens arregimentados pelo desejo de brincar. A proposta de Cícero Mário Grigório, 20 anos, um dos coordenadores, era de que eles pudessem construir seus próprios instrumentos e tocá-los com as mãos e o destino. Como professor, ensinou as batidas iniciais para os poucos alunos que se dispuseram a aprender sobre o ritmo. No dia seguinte, muitos não vieram, outros se desgarraram, mas a inconstância não lhe serviu de desestímulo. Por persistir, o projeto encontrou novos rostos e sonhos.
Hoje, já consolidado, o grupo possui dois núcleos na comunidade. Um na rua Maguari, outro na rua Cantareira - duas áreas divididas por uma fronteira que ninguém vê, mas que a violência fez questão de impor. São territórios distintos de um mesmíssimo lugar. “Nossa ideia é tentar acabar com essa divisão desde o começo, com eles ainda pequenos”, compartilha Cícero.
A realidade vem se modificando ainda que aos poucos, acredita Kássia Oliveira, 24, que também coordena o grupo. A memória recorda meninos que jamais poderiam se ver, por conta da imposição dos territórios, mas que se uniram (e se abraçaram) pela música. “Eles tinham medo de descer para as apresentações, mas quando tocavam juntos, percebiam que eram os mesmos”, comenta.
Foi nessa batucada que Livia Thais Morais, 20, elaborou novas versões de si e da própria comunidade. Os preconceitos, antes fundamentados na negação da periferia como lugar, desconstruíram-se pela música aprendida no projeto. O que antes era motivo de vergonha, passou a ser bandeira de luta por transformações e visibilidade. “Pela música, eu aprendi a me respeitar como negra, mulher e moradora da periferia”, enumera.
Justo ela, que nunca imaginou ser instrumentista, viu-se interessada em perpetuar o projeto, disposta a aprender novas linguagens e compartilhar entusiasmo com os outros colegas, vizinhos. No palco, Livia Thais tomou segurança e divisou a arte como estrada. “Quando a gente se apresenta, tem aquela sensação boa de liberdade. A gente pode muita coisa no palco”, diz.
Atualmente, o projeto Palmerê conta com 20 meninas e meninos como ela, que aprendem sobre a música e o mundo que está em volta. As questões sobre racismo, territorialidade e mudanças perpassam as canções por eles ritmadas. Também guardam influências do baião, do rap, do maracatu, mas, principalmente, da vontade de se perceber pela arte. (Rômulo Costa)
BATUQUE
O Palmerê ensina música a 20 crianças e adolescentes de todos os lados do Conjunto Palmeiras. Pela percussão, o conjunto tenta desconstruir as fronteiras impostas pela violência no bairro. A iniciativa partiu de jovens instrumentistas que também aprenderam o ofício em projeto social.
WEBDOC
O webdocumentário Juventudes - diálogos urbanos, episódios 1 e 2, promove encontros entre jovens de diferentes realidades de Fortaleza e mostra proximidades e distâncias que há entre seus universos. Acesse em: www.opovo.com.br
Hoje haverá encontro de juventudes no Espaço O POVO de Cultura e Arte, a partir das 17 horas, com música, dança urbana e teatro.
Quem quiser entrar em contato com o Grupo Palmerê pode usar o número (85) 98804 3158. O endereço é avenida Valparaíso, 673 - Conjunto Palmeiras.
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