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O governo do presidente Mauricio Macri enfrentou ontem o maior protesto em nove meses. Marchas iniciadas em cinco regiões da Argentina culminaram na Praça de Maio, numa mobilização em que dezenas de milhares levaram bandeiras contra aumento de tarifas, ajustes e desemprego. O ato uniu sindicatos que se opuseram ao kirchnerismo aos que foram "chapa branca", o que deu força à ameaça de uma greve geral.
Embora a adesão tenha ficado abaixo da projeção de 100 mil manifestantes, o tamanho da aglomeração e o modo como ela se formou surpreenderam tanto quem participava quanto os que só queriam voltar para casa no fim da tarde.
Na Avenida 9 de Julho, a principal de Buenos Aires, a passagem das cinco colunas de militantes que começaram a viajar para a capital na quarta-feira tornou o trânsito caótico. Dois grupos haviam saído em comboios da Patagônia, outros dois do extremo norte, a parte mais pobre do país, e um de Mendoza, na fronteira com o Chile.
Nos cafés da Avenida de Maio, que liga a Casa Rosada ao Congresso, os televisores sintonizados em canais antikirchneristas enfatizavam os engarrafamentos. Nos estabelecimentos com aparelhos ligados nas emissoras críticas ao macrismo, a narrativa se concentrava nos discursos dos sindicalistas, que começaram às 17h num dos três palcos montados na diante da sede presidencial.
"Começou a contagem regressiva para a greve geral", disse Hugo Yasky, secretário-geral da Central de Trabalhadores da Argentina, respondendo ao corro de manifestantes que pedia uma paralisação nacional, a medida mais extrema para pressionar por uma revisão do ajuste econômico de Macri.
Entre as exigências dos que discursaram, a principal era reabertura de negociações salariais. As categorias acertaram reajustes entre março e abril tendo como referência uma meta de inflação anual de 25%. Como o índice ficará acima dos 40%, os sindicatos exigem atualização. O ministro das Finanças, Alfonso Prat-Gay, respondeu nesta semana que o aumento de preços já não preocupa e a meta tende a ser alcançada a partir de agora. A inflação de agosto deve ficar abaixo dos 2%.
Em parte, a explicação para a redução recente no ritmo do índice de preços é uma derrota do governo - o veto parcial da Corte Suprema ao "tarifaço" que se tenta implantar desde o início do ano. Reajustes de até 10 vezes nas contas de água, luz e gás despertaram críticas de aliados e até de quem concorda que os subsídios do kirchnerismo eram insustentáveis. No mês passado, magistrados bloquearam a alta no gás, que o governo tinha aceitado limitar a 400%, e há ameaça de o mesmo ocorrer com a energia elétrica.
Outro fator que ajudou a engordar a mobilização de ontem é o desemprego de 9,3%. O governo efetivou um plano de demissões que segundo os sindicatos custou 200 mil vagas. A Casa Rosada contesta o número e alega que se tratava em sua maioria de "nhoques", apelido dos funcionários públicos que ocupavam cargos por serem kirchneristas, sem trabalhar.
Pressão
Na avaliação da cientista política Mariel Fornoni, da consultoria Management& Fit, protestos semelhantes devem ser mais frequentes até o fim do ano, pela percepção de que a economia não se recupera. Há previsão de queda de até 1,5% no PIB. Em viagem à China para a reunião do G-20, Macri busca investimentos, que não chegaram no ritmo que sugeria o otimismo externo com sua vitória eleitoral.
O ministro do Trabalho, Jorge Triaca, admitiu problemas em alguns setores, mas acusou a marcha de ter "teor ideológico". "Entendemos as dificuldades que muitos setores apresentam. É um momento de transição que esperamos seja o mais breve possível", afirmou.
Uma imagem das dificuldades mencionadas pelo ministro ocorreu também na Praça de Maio, há 10 dias. Uma fila de 800 metros se formou quando produtores de maçãs e peras começaram se desfazer de 10 toneladas de estoque em protesto, já que preço de venda está menor que o de custo. A estratégia foi tão certeira que a cota foi limitada a duas frutas por pessoa. Produtores de leite e cítricos anunciaram que farão o mesmo. (Rodrigo Cavalheiro)
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