[an error occurred while processing this directive] Micro e macro | Opinião | O POVO Online
ARTIGO 28/12/2016

Micro e macro

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Quatro cenas. 1) No filme Os homens que encaravam cabras um general lê sobre tunelamento quântico (onde uma partícula atravessa uma barreira “proibida”) se levanta, grita “é só uma questão de probabilidade e vontade” e dispara em direção a uma parede. 2) Procuro por Carlos Lenz na web e caio num site de Ovni que diz: como comprovado pela ciência que a luz laser consegue levitar partículas numa célula (pinças óticas) assim um disco voador pode abduzir uma pessoa com um facho de luz. 3) No problema clássico de infinitos macacos – ou um macaco por tempo infinito – digitando teclas ao acaso acabariam por digitar um texto do dramaturgo inglês William Shakespeare. 4) Numa palestra TED Talk, um “prêmio Nobel” diz: há 1.020 planetas habitáveis no Universo, mesmo que a chance de existir vida em algum seja muito pequena, quando multiplicada por esse número, há vida avançada por aí.

 

As cenas acima ferem a boa ciência. A chance de tunelamento depende da pequenez da barreira, e, quando levada ao macroscópico, ela na prática é nula. Pode-se ter um general pela idade do Universo, ou infinitos generais, tentando atravessar paredes e não haverá um único sucesso. Se o caso fosse de somente alguns átomos do general saírem de maneira incoerente, aí há uma chance ínfima calculável. A pinça ótica da cena 2 só funciona num regime especial e de forças muito pequenas, não é possível extrapolar para a abdução de uma minhoca, que dirá de uma pessoa.


A cena 3 traz aspectos das cenas 1 e 4: é preciso cautela no produto de um número muito grande por outro muito pequeno mesmo que se conheça bem um dos números (no caso do macaco sabe-se quantas teclas existem). E ainda que um macaco conseguisse digitar a primeira linha de 60 caracteres da peça Macbeth não perceberia nada de especial nesta, comparada com as outras 2.760 possibilidades. Pode ser que haja vida lá fora, mas esse tipo de argumento estatístico é fraco. Assim, também arguir a passagem de um sistema simples para um complexo por mero acaso é falacioso. Simples tentativa-e-erro não produz nada interessante. Para funcionar, há de existir “inteligência” que aprenda com os erros e acertos, ou um mecanismo de “incentivo”.


Na física, o incentivo é “a diminuição de energia”, e só em casos simples as chances são calculáveis. Já na biologia viva, é a sobrevivência diante da competição, acidentes e da limitação de recursos básicos, como a alimentação. Assim, caro leitor, cuidado com probabilidades pequenas e argumentos simplórios. A boa Ciência pode se perder nas casas decimais ou em entrelinhas.

 

Cláudio Lenz Cesar

lenz@if.ufrj.br

Professor titular da UFRJ, PhD pelo MIT, pesquisa antimatéria no CERN

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