[an error occurred while processing this directive][an error occurred while processing this directive] Paul Simon nos leva ao passado | Coluna Thomas Friedman | O POVO Online
Thomas Friedman 01/06/2012

Paul Simon nos leva ao passado

Simon, meu amigo ficou espantado com o apartheid, mas ficava indignado com a ideia de que, ao colaborar com artistas negros sul-africanos...
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De todos os discursos duros e fortes do documentário altamente recomendado de Joe Berlinger, “Sob os Céus Africanos”, acerca da gravação do álbum clássico de Paul Simon “Graceland” na África do Sul em 1985 - e o reencontro dele com os mesmos artistas africanos 25 anos mais tarde -, meu favorito é o do baixista de Graceland Bakithi Kumalo. Ele conta sobre o dia em que conheceu Simon num estúdio de Johannesburgo em 1985:


“Eu estava trabalhando como mecânico”, diz Kumalo, “e um dia recebi um telefonema do meu chefe e ele disse: ‘ei, Paul Simon está na cidade, sabia? E ele está procurando alguns músicos’. E eu disse: ‘Paul Simon, quem é Paul Simon?’ Quer dizer, eu não tinha ideia. E ele tentou me explicar, cantando todas as músicas. Você sabe, como músicas de Simon e Garfunkel. E eu disse: ‘não tenho a mínima ideia’. Então, peguei meu baixo e fui ao estúdio e encontrei Paul e Roy Halee, o engenheiro, e eles falaram algo como: ‘ei, cara, vamos tocar um pouco’. Nós tocávamos um acorde - Paul sorria... e parava e mudava. Não sabíamos por que ele estava mudando. Mas ele precisava de outra parte lá e nós não sabíamos. Daí, ele fazia um intervalo e nos dava diferentes acordes, e aprendíamos coisas diferentes e parecia que tínhamos voltado à escola de música.”


Assistir a esse filme é realmente como voltar à escola de música e muito mais. Para muitos, é voltar para a primeira vez que, de fato, ouviram as harmonias e os ritmos únicos da música africana - graças a “Graceland”. Para outros, é como entrar no estúdio de um dos músicos mais criativos de nossos tempos, vê-lo provar e experimentar estilos, vozes e melodias dos músicos sul-africanos e misturá-los com os acordes e letras que dançavam em sua própria cabeça para transformá-los em músicas que nós cantamos desde então. Quem sabia que ela tinha diamantes nas solas dos sapatos?


Mas o que me intrigou foi voltar para a política de meados dos anos de 1980, quando o apartheid sul-africano estava no momento mais pernicioso, levando o Congresso Nacional Africano, ou ANC, a pedir um total boicote diplomático, econômico, esportivo e cultural.


Isso foi antes da internet, da globalização, do iTunes e do YouTube. Simon foi atraído pela música da África do Sul por conta de uma fita cassete enviada a ele pelos Boyoyo Boys. O músico dentro dele insistiu em perseguir aquele som até suas origens, independente da política. Quando ousou ignorar o boicote cultural para fazer Graceland, ele ajudou a globalizar, à moda antiga, os talentos e sons de um grupo de músicos sul-africanos - um show e um disco por vez - e, no processo, empoderou esses artistas como nenhum movimento de libertação poderia ter feito.


Hoje, os Boyoyo Boys teriam apenas colocado um vídeo no YouTube e se globalizado. Mas isso não era possível então. Mesmo assim, Simon tinha o direito, e estava certo, de fazer o que fez?


Em meio ao filme, estão as cenas de um encontro, 25 anos depois dos eventos, entre Simon e Dali Tambo, o cofundador sul-africano do Artistas Contra o Apartheid, que impôs o boicote cultural.


“Acho que ele teve uma ótima ideia criativa de misturar a música, os ritmos e a ingenuidade dele com algo que encontrou na África do Sul”, lembra Tambo. “Mas, naquela época, não ajudou… Estávamos lutando pela nossa terra, pela nossa identidade. Tínhamos um trabalho a fazer, e era um trabalho sério. E víamos a vinda de Paul Simon como uma ameaça… porque não era sancionada pelo movimento de liberação.”


Simon, meu amigo, ficou espantado com o apartheid, mas ficava indignado com a ideia de que, ao colaborar com artistas negros sul-africanos em uma síntese que lançava a música e os talentos deles para o cenário mundial, estivesse prejudicando a causa nacional.


“Quando o artista entra em algum tipo de desacordo com a política”, pergunta Simon no filme, “por que os políticos podem dizer a nós, artistas, o que fazer e nós devemos obedecer - ou então não seremos bons cidadãos ou boas pessoas?”


No fim, Simon e Tambo conversam isso tudo no filme e afirmam que nenhum deles tinha a intenção de prejudicar a causa do outro. De fato, o ANC havia convidado Simon e a banda de Graceland para tocar no centenário. Mas o filme recém-lançado não deixa dúvida sobre o lugar em que estavam os músicos sul-africanos.


Lembrando a turnê mundial deles com Simon depois que Graceland se tornou um sucesso, o saxofonista Barney Rachabane observou: “Na África do Sul, não tínhamos oportunidade. Só podíamos tocar nos subúrbios. Não podíamos tocar nos belos clubes noturnos da cidade. Você podia sonhar, mas os sonhos nunca se realizavam. Isso nos destruiu. Mas Graceland abriu meus olhos e deu um tom de esperança à minha vida.”


O guitarrista John Selolwane acrescentou: “Eu me lembro de quando estávamos em turnê, especialmente na Europa, no inverno. Cada vez que Black Mabazo subia no palco e começava a cantar, eu ficava com lágrimas nos olhos. Eu pensava: ‘Aqui estou. Sou um menino africano. Estou no meio da neve e... há 50 mil pessoas enchendo o estádio’, e eu chorava. E pensava: ‘Nossa, estamos realmente vendo o mundo.’”


Tradução: Daniela Nogueira


danielanogueira@opovo.com.br

 

Thomas Friedman

Colunista de assuntos internacionais do New York Times, Friedman já ganhou três vezes o prêmio Pulitzer de jornalismo. É autor do best-seller O Mundo é Plano

 

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