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Assistia ao desfile das escolas de samba pela janela do escritório de meu pai, na avenida Presidente Vargas, no Rio. Quando a Mangueira se preparava na armação, meu pai me pegava pelas mãos. Descíamos pela escada o que eu imaginava fossem mais de 20 andares, para ver de perto a verde e rosa passar. Naquele tempo, sempre havia um jeito de entrar na avenida. Não sei como, mas meu pai devia saber. Pura emoção. Pela televisão, não tinha a menor graça. Acho que nem havia transmissão na época.
Hoje, o desfile das escolas é transmitido pela TV Globo para mais de 100 países. A audiência em todo o mundo é estimada em estratosféricos 300 milhões de telespectadores. Nem sempre foi assim.
Por puro ódio pessoal, os donos da TV Globo não só ignoravam como também combatiam ferozmente o projeto do sambódromo da Marquês de Sapucaí. Acusavam a obra de populista, desnecessária, faraônica. O governador do Rio era Leonel Brizola, inimigo número um da Vênus Platinada. Brizola, o perigoso socialista que ousava desafiar o poder de Roberto Marinho. E que venceu a eleição depois de denunciar o esquema que estava sendo posto em prática, com a cumplicidade da TV Globo, para fraudar a apuração dos votos e impedi-lo de chegar ao poder.
O grande idealizador do sambódromo, no entanto, foi Darcy Ribeiro, que encomendou o projeto a Oscar Niemeyer. Darcy, educador visionário, fez do sambódromo o embrião do mais ousado projeto educacional do século: o Ciep – as escolas públicas em tempo integral que os governos seguintes desmontaram de forma criminosa.
O primeiro ano de desfile na Sapucaí entrou para a história da televisão brasileira como o ano em que a TV Manchete derrotou a TV Globo na guerra pela audiência. Em 1984, Brizola quebrou o monopólio da Rede Globo nas transmissões de Carnaval, concedendo o direito também à Rede Manchete. A emissora da família Marinho desistiu então de cobrir o desfile. Eu era repórter da Manchete e vivi meus dias de glória, transmitindo o maior espetáculo da terra. Foi o ano do supercampeonato da Mangueira. Samba enredo em homenagem a Braguinha, que desfilou no carro abre-alas, sentado num banco de praça, esbanjando simpatia do alto de seus 80 anos. Darcy Ribeiro assistiu a boa parte do desfile sozinho, sobre as nádegas da sambista, o arco monumental desenhado por Niemeyer na praça da Apoteose, que se assemelha à bunda de uma passista. Darcy queria que a praça da apoteose fosse o grande desfecho do desfile, onde as escolas desfilariam em círculo para o povo nas arquibancadas. A manobra se mostrou inviável pelo tamanho dos carros alegóricos, que não conseguiam fazer a curva. Última escola a desfilar, a Mangueira deu um show na avenida. Darcy não se conteve. Desceu para a área de dispersão, mandou os sambistas circularem e voltarem pela avenida. A Mangueira foi a única escola até hoje a fazer o trajeto de ida e volta no sambódromo. Atrás dela, o povo das arquibancadas, garis, trabalhadores e nós, jornalistas e técnicos da Manchete.
Escrevo antes de sair o resultado da campeã do Rio. Mas depois daquele desfile de 1984, só agora a Mangueira me fez arrepiar outra vez, com aquela paradinha de tirar o fôlego.
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