[an error occurred while processing this directive] "Propostas que permitem/permitam pensar..." | O POVO
Professor Pasquale 19/12/2011

"Propostas que permitem/permitam pensar..."

A pergunta nos convida a refletir sobre o valor dos tempos e modos, mais especificamente o presente do indicativo e o do subjuntivo
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Pasquale Cipro Neto


Um leitor diz que estava assistindo a um programa jornalístico em que se falava da recém-encerrada conferência sobre o clima, realizada na África do Sul. Diz o leitor que, a certa altura, um dos convidados afirmou que “é preciso acabar com o discurso vazio e apresentar propostas que efetivamente permitam pensar em dias melhores”. Esse leitor quer saber se no lugar de “permitam” (“propostas que permitam...”) seria possível empregar “permitem” (“propostas que permitem pensar em dias melhores”).


A pergunta nos convida a refletir sobre o valor de determinados tempos e modos, mais especificamente o presente do indicativo e o do subjuntivo. De início, é bom lembrar que o indicativo é o modo da realidade, da certeza, da confirmação, enquanto o subjuntivo é o da dúvida, da suposição, da probabilidade. Assim, quem diz “Creio que essa solução é a mais adequada” manifesta sobre a solução que está em discussão com mais convicção do que quem diz “Creio que essa solução seja a mais adequada”. O que permite afirmar que a primeira frase expressa mais certeza ou convicção do que a segunda é justamente a opção por “é” (do indicativo). Na segunda frase, a opção por “seja” (do subjuntivo) salienta que o conceito sobre a definição do vocábulo não é tão firme quanto o é na primeira frase.


Verifica-se processo semelhante em “É preciso apresentar propostas que permitem/permitam pensar em dias melhores”. Não se trata de discutir o que é certo e o que é errado; o que se discute é o plano em que se quer pôr o processo expresso pelo verbo “permitir”. A opção por “permitem” (do presente do indicativo) coloca o processo no plano da certeza, da realidade (há certeza ou convicção de que essas propostas permitem pensar em dias melhores). A opção por “permitam” (do presente do subjuntivo) põe o processo no plano da suposição, da hipótese, da dúvida (dá-se como potencial a capacidade dessas propostas de fazer pensar em dias melhores).


Há um bom tempo, o vestibular da Unicamp abordou o problema do emprego do modo verbal (indicativo/subjuntivo) sob outro aspecto. O enunciado da questão era este: “Em 28/11/2003, quando muito se noticiava sobre a reforma ministerial, um jornal publicou uma matéria intitulada ‘Lula sugere que Walfrido e Agnelo ficam’. Considerando as relações entre as palavras que compõem o título da matéria, justifique o uso do verbo ‘ficar’ no presente do indicativo”.


O problema é diferente do que discutimos nos parágrafos anteriores. Estão em jogo sutilezas que devem ser observadas com atenção. Uma delas se refere ao significado de “sugerir”. Quando se diz “Sugiro que você leia esse livro”, o verbo “sugerir” significa “aconselhar”, “fazer uma sugestão”, “propor”. É exatamente aí que está o nó da questão. O fato de João sugerir a José que leia o livro não garante que José o lerá. O ato de ler, portanto, está no plano da hipótese, da possibilidade, o que explica o emprego do subjuntivo (“que leia”).


Se no título jornalístico destacado pela Unicamp a forma “ficam” fosse trocada por “fiquem” (“Lula sugere que Walfrido e Agnelo fiquem”), “sugerir” seria equivalente a “propor”, “fazer sugestão”. Com isso, informar-se-ia que Lula propunha a permanência de Walfrido e Agnelo no ministério. A decisão sobre a permanência dos dois não seria de Lula. No título efetivamente publicado, a forma usada é “ficam”, o que muda tudo. O emprego de “ficam” (do presente do indicativo) faz o verbo “sugerir” ter o significado de “dar indícios”, “dar pistas”, “dar sinais”, “deixar vazar”. Não se pode esquecer que o sujeito de “sugere” é “Lula”, ou seja, o então presidente da República, a quem a Constituição confere o poder de nomear e demitir os ministros. Com “sugere que ficam”, salienta-se que a decisão sobre a permanência de Walfrido e Agnelo cabia a Lula.


Até segunda. Um forte abraço.

 

espaço do leitor
Michael Burkett 30/10/2013 21:10
Texto brilhante e conhecimento precioso. Perspectivas de grande ajuda para mim. Agradeço. :)
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