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Demitri Túlio
Porque foi proibido de ir às gravações de um especial da Xuxa em Sobral, tentou se matar tomando uma cartela de Metiocolin B12. Comprimidos róseo-hepáticos engolidos a seco no quarto dos pais. Entre grogue e revirando os olhos, desmaiado nos braços de um vaqueiro da família, o menino foi levado às pressas para a Santa Casa de Misericórdia.
Era fã, de dar faniquitos, da Xuxa e sempre organizava musicais na garagem da casa. Enquanto o pai não chegava, se enfiava numa peruca loira, botas até os joelhos e roupas brilhosas que ele mesmo costurava. Tinha uns 14 anos e, mesmo depois de tantas surras, nunca abriu mão do sonho de ser uma paquita.
O pai era desses machões sobralenses. Mascate bem sucedido, da rama de um clã tradicional que dava nome a ruas, praças e favelas da cidade. Do naipe dos que foram iniciados por jumentinhas, cabras e cortesãs que serviram no casarão como empregadas. E quengas do mafuá de dona Enedina.
O menino nem sempre tinha o brinquedo que desejava. O pai enchia o quarto dele de bolas de futebol, autoramas do Fittipaldi, Ferroramas, índios, soldados americanos, cavalos, Forte Apache... Um dia, o açoitou porque o flagrou despindo o Falcon para ver o que havia entre as virilhas. Foi uma senhora pisa.
Integrante de uma liga católica, apesar de ter filhos fora do casamento e nunca ter deixado de se enrabichar com quem desse cambimento, foi aconselhado a mandar o filho para Fortaleza. Ali havia uns carismáticos que prometiam a cura de meninos salientes, metido às avessas.
E assim o fez. Deixou o rapazinho aos cuidados de uma irmã que morava na Duque de Caxias, esquina com Barão do Rio Branco, próximo à Igreja do Carmo. Nada lhe faltava, nem primos que por causa do Atari - presente do Dia das Crianças - o bajulavam.
- Tá bom de besteira véia de vídeo game. Vocês prometeram e agora vão brincar do que eu quero. Vamos brincar de escola. Eu sou a professora!
- Não, escola não. Besteira. De chute a gol na porta da igreja.
- Nem morta, é muito grosseiro e pode assustar a Carmô. Já sei, vamos brincar de boate.
- Boate? Como é que se brinca de boate?
- Fácil. Vamos para o meu quarto, eu apago as luzes, boto música das Frenéticas e da Xuxa e a gente dança...
- Não. É muita baitolagem.
Essa história termina assim. O menino de Sobral nunca mais voltou à casa do pai que um dia teve um derrame e ficou com uma banda morta. Jovenzinho, foi obrigado a entrar em uma comunidade carismática em São Paulo e virou padre. De volta a Fortaleza, não teve um ano que não comemorasse o aniversário no Duques e Barões - bar que ficava na esquina da rua Barão do Rio Branco com avenida Duque de Caxias. Era o Dia da Xuxa.
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