A Viagem
segredos que faltam decifrar
Demitri Túlio demitri@opovo.com.br
1º Dia
Ao deixar de avistar a baía de Todos os Santos, comecei a marear. Foram quase três dias vomitando e soro para reidratar. Embarcamos, na tarde de 18/3, na Base Naval de Aratu (Salvador) com destino a Trindade (ES).Após três dias e meio de um oceano quase sem fim, e uma insistente onda de través (que tromba na lateral do navio e faz vomitar até a alma), aportamos ao largo do ilhéu. Como fizeram portugueses e ingleses há mais de 500 anos. Lugar mais extremo do País, numa perspectiva de continente/Atlântico, a ilha é hoje destino exclusivo de marujos e cientistas que tentam decifrar o rosário de mistérios que o ilhéu ainda oculta. São 9,28 de quilômetros quadrados de terra firme fincados na extremidade oriental da cadeia de montanhas submarinas Vitória (ES)-Trindade.
Ainda há lacunas sobre a origem e as transformações de Trindade, apesar dos registros de investigação científica se reportarem a 1918. Do tempo das viagens do explorador Bruno Álvaro da Silva Lobo e seus relatórios para a Biblioteca Nacional.
Na ínsula, para surpresa de quem espera encontrar criaturas medonhas e peçonhentas, o mais voraz dos predadores é um caranguejo amarelo (Johngarthia lagostoma). Habitué da terra firme, ele devora tudo que as grandes patas alcançam.
Outro enigma científico em Trindade é a vegetação. Só surpreendente a 3.500 metros de altura. Uma floresta de samambaias gigantes, que nos transporta para cenários da idade dos dinossauros, desafia pesquisadores. Foi o que restou de uma flora exuberante que existiu até o século XIX.
Desde dezembro de 2010, o Programa de Pesquisas Científicas na Ilha de Trindade (Protrindade), vinculado à Secretaria da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar, tem investido em expedições e atraído pesquisadores de universidades brasileiras para decifrar esse recôndito da Amazônia Azul.
De dois anos e meio pra cá, 253 cientistas se arrancharam no Posto Oceanográfico da Ilha de Trindade (Poit) para explorar a ilha. Atualmente, segundo o cearense Rodrigo Otoch, 45, capitão-de-fragata e atual gerente do Protrindade, 25 projetos científicos estão em curso.
O POVO nos enviou, eu e a fotógrafa Luciana Otoch, para reportar sobre a 23ª Expedição Científica à Trindade. Onze dias entre o mar e a ilha. No ímpeto dos desbravadores de ontem e hoje. Uma viagem ao fim ou começo do mar que se desenha em um dos longe do Brasil.
Boa leitura!