Artigo 30/03/2014

Acendendo o verão - da outra margem

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Ingrid Coelho ingridrodrigues@opovo.com.br


Ângela Linhares


E com as folhas do meu outono esquivo, decora as águas do teu rio, dizia Lorca, em seu poema intitulado Tenho medo de perder a maravilha. Entre o namoro da experiência – este esquivo outono – com as águas dos rios que correm no impetuoso agora, que se poderia cantar que falasse de esperanças em águas de março?


Poder-se-ia dizer que março traz certo estado de maravilhamento com o que virá? O que poderia acender como flores a esperança nos novos dias? – perguntava-me, enquanto via mudarem o canal da guerra para o das violências de toda natureza; o da Copa para o das enchentes e secas. Enquanto isso, na mesa da casa pequeníssima, onde cada um se alimenta em horas diferentes, devido aos diversos horários do trabalho, um avô chamava, solene, para o almoço. Na fala simples de um sertanejo eu ouvia: a esperança dos sertões - da alma – é plantio que se renova dia a dia. E continuamos entre águas novas e sementes de futuros, conversando sobre os dias que vão vir. Ante a violência das ruas, perguntava-se: não seria uma violência equivalente o desvairado consumo do supérfluo e a indiferença à dor do Outro? Entre uma e outra, o compromisso com as transformações dentro e fora de nós se faz mais urgente. E a pergunta que um jovem me fez abriu o verão em mim: podemos realizar transformações no contexto de uma cultura de paz?


Pensa-se vulgarmente que paz é uma palavra engastada em um ponto fixo e que em sua construção não há conflitos. Ainda, não se sabe considerar a construção da paz com a complexidade que exige: como um desenvolvimento de todas as dimensões humanas - corpo, arte, ética, moral, política, afeto, inteligência e espiritualidade. Avançar só com uma dimensão é fazer com que as outras todas se voltem contra nós, diria Jung. Na verdade, seria preciso construir experiências de diálogos em todos os campos da vida social, aliando as várias ciências, religião e filosofia, nesse permanente diálogo onde vários aspectos da realidade são chamados a comparecer.


Olhando a floração das acácias no muro, lembrei que uma vez perguntaram ao Chico Xavier:


- O que há de novo, Chico? E ele, alegre, respondeu: - “O evangelho, meu filho”. Mas... o que temos feito das boas notícias trazidas por Jesus? (A palavra evangelho significa “boas notícias”.) Que contribuições estamos dando nesta transição planetária – momento de intensificação de transformações em escalada mundial, onde somos chamados a avançar com mais vigor?


A hora presente é nosso campo de cultivo; nele estudamos lições antigas, que ainda não aprendemos e ingressamos em capítulos novos de nossa história pessoal e coletiva. A reencarnação deixa dentro da gente o aprendido e, em geral, o esquecimento do passado acontece para que as cenas vividas outrora não corrompam as possibilidades de inscrevermos novos ensaios de ser em nossa vida.


Fica, contudo, no ser aprendente o que fora aprendido, com seu impulso para refazer-se e realizar novos desenvolvimentos. É que a nova ambiência reencarnatória traz seus vetores atrativos - situações e pessoas que parecem ímãs a nos “chamar” para nossa aprendizagem para se fazer agora.


O jovem observara março findava; o ano começava em mar alto. E no meio da conversação uma frase legendava o momento precioso: seria importante não perder de vista as conquistas sociais que devemos sedimentar e fazer avançar. Por que valorar apenas as irrupções do desespero em sua face mais dolorosa? Todos ali – eu via - ensaiavam narrar suas histórias fundamentais e as dos grupos onde atuavam. Sabíamos: seria preciso ver agora, em nossa vida interior e no mundo, os momentos mais apurados das conquistas para sentir, como um mel de caju no tacho, o doce que ficou das floradas.


O social começa em nós, já que o pessoal é também político, além de transcendente. Assim, entre as visualidades, os cheiros, as comidas, as músicas em suas voragens, como também entre o trabalho e as lutas pela vida, falava-se do desafio de construirmos uma cultura de paz e de vida. Na energia fecundante dessa hora em que os olhos do mundo veem por meio da Copa, podemos nos interrogar o que tempos feito da esperança que se tece dia a dia; não meteórica, mas reflexiva, operante, amorosa.


Aceso o verão, ouvi ainda a voz do jovem, que agora reparto, altear-se: desloquemos um pouco nosso olhar - se estivéssemos na outra margem, no plano espiritual, e deste outro lado pudéssemos verter o olhar sobre o vivido, o que veríamos de nossa contribuição no agora, dessa outra margem?


Ângela Linhares é membro da Federação Espírita do Ceará

 

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