[an error occurred while processing this directive][an error occurred while processing this directive] Gordinhos | Coluna Pedro Salgueiro | O POVO Online
Pedro Salgueiro 02/10/2013

Gordinhos

Claudiomiro acabou encerrando a carreira prematuramente por não conseguir controlar tanto peso, nas pernas e nos ouvidos
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Ser gordo não é fácil: vos digo sem cerimônias.


Por isso sou solidário com os pesados (e pesadas, claro). Ser gordito, pois, não é mole (desculpem o trocadilho infame): afirmo por que me tornei um já na idade adulta; depois de uma infância e uma adolescência de magricelo. Explico: eu era tão magro que facilmente contava as costelas, andava curvado e tinha apelido de mané-magro, o louva-a-deus nordestino. O que já me incomodava muito, acreditem; mas nada comparado aos transtornos por que passam (ops, passamos) os “graúdos”.


Quer saber se tens “defeitos” de verdade? Se deixe passar ao lado do ônibus de estudantes em excursão “educativa” pelas ruas de nossa sonsinha loura destrambelhada pelo sol: “Ei, tarado, solta a menina” ... “Pouca-telha, tira o cabelo da testa” ... “Sai do meio da rua, rolha-de-poço!” Ninguém escapa à fúria preconceituosa de estudantes jovens reunidos em passeio educativo. Terríveis, acreditem, já fui um deles...


Minha saga começou, como disse, tarde, adulto, empregado, formado duas vezes: o comodismo da repartição e a maravilhosa descoberta da cerveja ajudaram, as macarronadas matrimoniais sacramentaram de vez a sina: gordo! Tentei em vão continuar com a “pelada” de quarta-feira à noite — desisti quando passei a ser confundido com a bola. Assumi de vez a fama de gordinho, conformado e com paciência passei a suportar toda sorte de, como se diz hoje, “bulling”: apelidos: “Tio Chico”, “rolha-de-poço”, “fofa-chão”... É triste demais ser gordo (talvez por isso sejamos tão simpáticos, para compensar), mas nada pior do que aquele preconceito disfarçado em boas intenções: “Ah, sabia que estou fazendo um regime maravilhoso”, diz a cunhada; complementa de lá a irmã (já olhando pra mim): “Por que tu não tentas o da sopa?”...


Afora as deselegâncias mais indiscretas — a colega de trabalho, que há tempos não encontramos, sapeca (sem dó) lá do cantinho do elevador lotado: “Olá, quanto tempo, hein!? Quase não te reconheço...”... Sorrio, balanço a cabeça e espero pelo desfecho, mas fecho mentalmente os ouvidos, “você engordou um pouquinho”, diz ela, simpática... Desço com um cândido sorriso, as unhas furando a palma das mãos, antes que retruque dizendo que também quase não a reconheci: “você envelheceu um pouquinho”, digo (também) mentalmente... Os eufemismos e diminutivos são, em algumas ocasiões, por demais cruéis, não é verdade?


***


Às vezes, sofremos pelos outros: fanático por futebol sempre admirei alguns jogadores que foram, digamos assim, robustos; eu, torcedor do Internacional de Porto Alegre, tinha por ídolo, era a década de 1970, um centroavante que brigava constantemente com o peso, com a malhação da imprensa e dos torcedores, era Claudiomiro, que acabou entregando os pontos e encerrando a carreira futebolística prematuramente por não conseguir controlar tanto peso, nas pernas e nos ouvidos. No meu mesmo colorado gaúcho, década depois, apareceu Caçapava, que brilhou como cabeça-de-área, chegando até a seleção brasileira, também teve que encerrar jovem a carreira, precisamente aqui no Ceará Sporting Club, onde o “mais leve” apelido que ganhou da torcida do meu querido Leão do Pici foi de “suspensório de baleia”.


Mais recentemente os gordinhos têm tido mais sorte: Ronaldinho jogou quatro copas do mundo e é recordista de gols em mundiais, enfrentou com êxitos adversários, críticas e gozações por seu excesso de gordura. Atualmente venho acompanhado a massacrante saga do talentoso centroavante (e como ele me lembra o Claudiomiro, aquele do saudoso Inter da década de 1970) Valter, do Goiás, para se livrar dos beques, que inutilmente tentam tirar seus cento e tantos quilos da “jogada”; também para driblar a imprensa desportiva, que não sai de seu pé, com críticas e (principalmente) gozações infantis, como as muitas frases despretensiosas no meio de reportagens que apenas visam afirmar que, mesmo ele sendo um sucesso, está bem acima do peso. E tome “centroavante de peso”, “peso da camisa”, reportagens com nutricionistas, até um físico dia desses deu entrevista para explicar o “fenômeno Valter”. Esta semana sua esposa pediu clemência à imprensa: o deixassem em paz!


***


Ah, mas não pensem que ser gordinho só tem desvantagens, nem falo nas vantagens: daria muito mais do que uma reles crônica.


“Tem coisas muito piores...”


O amigo, e poeta talentoso, Carlos Nóbrega (tentando consolar, e coçando a calva) me diz:


“Mas bem pior do que gordinho é ser careca.”


***


Mas vos afirmo: sou um gordinho careca. E tenho sobrevivido.

 

> TAGS: salgueiro pedro
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Chagas Sales Nogueira Lima 08/10/2013 13:36
Tuas crônicas hilariantes, temperada de "sagacidade", nos remetem a fatos tão reais e imorais, dessa nossa sociedade globalizante, que faço aqui meu registro de admiração. Abraço forte a você e aos "estranhos gordinhos".
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Chagas Sales Nogueira Lima 08/10/2013 13:32
Tuas crônicas hilariantes, temperada de "sagacidade", nos remetem a fatos tão reais e imorais, dessa nossa sociedade globalizante, que faço aqui meu registro de admiração. Abraço forte a você e aos "estranhos gordinhos".
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Chagas Sales Nogueira Lima 08/10/2013 13:32
Tuas crônicas hilariantes, temperada de "sagacidade", nos remetem a fatos tão reais e imorais, dessa nossa sociedade globalizante, que faço aqui meu registro de admiração. Abraço forte a você e aos "estranhos gordinhos".
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Chagas Sales Nogueira Lima 08/10/2013 13:29
Tuas crônicas hilariantes, temperada de "sagacidade", nos remetem a fatos tão reais e imorais, dessa nossa sociedade globalizante, que faço aqui meu registro de admiração. Abraço forte a você e aos "estranhos gordinhos".
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Chagas Sales Nogueira Lima 08/10/2013 13:29
Tuas crônicas hilariantes, temperada de "sagacidade", nos remetem a fatos tão reais e imorais, dessa nossa sociedade globalizante, que faço aqui meu registro de admiração. Abraço forte a você e aos "estranhos gordinhos".
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