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De Nova Iorque, um amigo enviou um presente para o pai. Um casaco bem parecido comprado numa loja bacana e para ser vestido no agreste. Não há cristão que não bata os dentes quando a noite se faz por lá, mesmo na seca.
Além da roupa de frio, remeteu também uma missiva de filho pra pai e mãe; e de irmão para irmãs (são duas). Carta escrita à caneta, selada no gelo do estrangeiro, e saudades de véspera porque o pai foi tomado por uma doença de tocaia aos 70 e poucos. Está aqui, mas já se foi.
E, sabem lá nossas desculpas amarelas, o casaco seria o último jeito de abraçá-lo. Derradeira tentativa de esquentar seus dias indo e lhe sarar a dor morfina. Ainda não havia se acostumado com a viagem inevitável do pai.
Mesmo sabendo, tinha a leitura dos esclarecidos, que a vida tem uma noite que não amanhece. Porque é sublime o rebento. Sabia, sabia... Mas fazer o quê com a saudade antecipada? Ausentar-se dela? Nem que quisesse.
Na carta, comemorava o pai ainda estar no meio de todos. Até dele, apesar de ter se mudado para Fortaleza desde quando resolveu mudar o destino. Nunca faltaram os telefonemas e conversas esticadas de bem querer.
Saudade antecipada não é sentimento que se queira ao mais emboanceiros dos inimigos. Engasgar por lembrar quando o pai era um gigante, tinha asas invisíveis e atravessava o São Francisco inteiro sem ser uma baleia?
Havia de ir se acostumando com a saudade que já era medonha. Lógico que papai já sabia que a passagem já estava comprada. Tanta visita, tantos sobrinhos, gente que não via há tempos, filhos indo e vindo além dos Natais...
E além disso, nunca foi homem de correr das assombrações e dos rabos de saias. Chegou a perguntar na carta uma preocupação. Queria saber se o pai estaria com medo de viajar sozinho. Mas riscou e recomeçou. O sobressalto era de filho querendo proteção.
”Pai, segue o casaco comprado aqui no estrangeiro. Meu medo é que não dê tempo chegar... Queria amenizar seus arrepios, seus inesperados, seus derradeiros...
E acreditar que creio que isso é só uma travessia. Que quando chegar o tempo, voltaremos a cruzar os destinos... Foi o senhor, mesmo, quem repetiu isso com tanta gente que partiu... É a rebentação!
Se eu fosse o tudo, não teria inventado a despedida, a última imagem, a viagem sem volta, a doença que vence no final. Mas deve ter um sentido...
Por mim, se o senhor desejar, for menos doloroso, não empalho mais sua ida. Não rezo por sua permanência, não luto com o impossível.
Vou chorar, vou chover, porque é da natureza e o senhor sempre riu da chuva...
DEMITRI TÚLIO é repórter especial e cronista do O POVO
demitri@opovo.com.brErro ao renderizar o portlet: Caixa Jornal De Hoje
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